Em 2012, nas encostas de Santo Domingo, perto de Medellín, Dubian Monsalve esculpiu um milagre em pedra. A “Montanha Grávida” nasceu do silêncio da rocha e da inquietude humana. Um bebê, protegido no ventre da montanha, repousa em posição fetal, como se a própria terra tivesse decidido gestar esperança. A obra é visceral, quase um sussurro da natureza dizendo: “a vida resiste”.
Mas hoje, em 2025, esse milagre circula em outro tipo de montanha, a digital. A imagem da escultura, acompanhada de um breve texto, viraliza no Facebook. Recebe curtidas, comentários, compartilhamentos. É tocante, sim. Mas também é efêmera. Em meio a memes, desabafos, anúncios e fake news, a “Montanha Grávida” vira mais um post na rolagem infinita.
O Facebook, essa praça pública global, é ao mesmo tempo confessionário, vitrine e campo de batalha. Ali, a dor é exposta com filtros, a alegria é medida em reações, e a verdade disputa espaço com versões. A escultura de Monsalve, que nasceu da pedra e do suor, agora vive em pixels e algoritmos. E a pergunta que ecoa é: o que fazemos com as informações que recebemos?
A obra de Dubian não foi feita para viralizar. Foi feita para curar. Cada traço é um gesto de amor à comunidade marcada pela violência dos anos 1990. Não há botão de “curtir” que capture isso. Não há emoji que traduza o peso de uma história esculpida com ferramentas simples e quinze dias de resistência.
No Facebook, tudo é simultâneo. A imagem da montanha aparece entre um vídeo de receita e uma discussão política. O tempo da contemplação é atropelado pelo tempo da atualização. E, no entanto, há algo de profundamente humano nesse impulso de compartilhar. Talvez, ao postar a “Montanha Grávida”, alguém esteja tentando dizer: “olhem, ainda há beleza”.
Mas será que olhamos? Ou apenas passamos os olhos? A montanha pede pausa. O bebê pede silêncio. E o Facebook, com sua pressa, raramente concede isso.
A crônica da escultura é também a crônica da nossa relação com o mundo. Monsalve enfrentou sol, chuva e vento para dar forma à vida. Nós enfrentamos notificações, bolhas de opinião e desinformação. Ele esculpiu com pedra. Nós esculpimos com cliques.
E talvez seja esse o desafio: transformar o consumo de informação em contemplação. Fazer do Facebook não apenas um espelho, mas uma janela. Uma janela para ver a montanha, sentir o ventre da terra, entender que há histórias que não cabem em um post — mas que merecem ser contadas, compartilhadas e, acima de tudo, vividas.
Porque, no fim, a “Montanha Grávida” não
é apenas uma escultura. É um lembrete. De que a vida, mesmo quando ferida, pode
ser gestada. De que a arte, mesmo quando esquecida, pode renascer. E de que,
mesmo em meio ao ruído digital, ainda podemos encontrar silêncio suficiente
para ouvir o coração da pedra.
© Alberto Araújo
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