No Quadro Efemérides de 11 de dezembro do Focus Portal Cultural assinala-se o terceiro ano do encantamento de Neide Barros Rêgo. Encantamento é a palavra justa: não se trata de ausência, mas de transfiguração. Neide permanece entre nós como presença viva, como chama que não se apaga, como voz que continua ecoando nos recitais, nas coletâneas, nos espaços culturais que ajudou a erguer. Sua partida não foi silêncio, mas continuidade. Celebrar Neide é celebrar a poesia como ato de resistência e beleza. É reconhecer que sua vida foi um fio tecido entre Minas e Niterói, entre a tradição e a inovação, entre o silêncio e a palavra.
Nascida em São Tomás de Aquino, Minas Gerais, em 18 de outubro 1938, Neide trazia consigo o sopro das montanhas mineiras e a delicadeza das cidades pequenas. Em 1957, formou-se professora em Niterói, e logo ingressou na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro. Estudou Administração Pública na Fundação Getúlio Vargas, mas foi na poesia que encontrou sua verdadeira vocação. Sob a influência da poetisa Maria Sabina de Albuquerque, mergulhou na Arte de Dizer, tornando-se discípula e, mais tarde, guardiã dessa tradição oral que transforma o poema em corpo, voz e gesto. A palavra, para Neide, não era apenas escrita: era respiração, era música, era presença.
Em 1961, Neide fundou o Centro Cultural Maria Sabina, inicialmente chamado “Salão Maria Sabina”. Ali, a poesia não era apenas lida: era vivida, declamada, dramatizada. O espaço tornou-se referência em Niterói, reunindo poetas, músicos e artistas em recitais memoráveis. Neide dirigiu cursos de Arte de Dizer, perpetuando a técnica e a emoção da declamação poética. O centro foi palco de homenagens, encontros e celebrações, consolidando-se como um templo da palavra. Mais do que uma instituição, o Centro Cultural Maria Sabina foi um gesto de amor: um lugar onde a poesia se tornava ponte entre gerações e territórios.
O legado de Neide Barros Rêgo é vasto e multifacetado. Na literatura, deixou poemas e textos que continuam a inspirar. Na oralidade, perpetuou a Arte de Dizer, ensinando que a poesia não é apenas escrita, mas também corpo e voz. Na cultura, criou e manteve o Centro Cultural Maria Sabina, espaço de resistência e celebração da arte. Na memória coletiva, foi presença constante em grupos como o Nuance, que desde 1985 realizava recitais líteromusicais. Na inspiração feminina, reafirmou o papel das mulheres na construção da cultura e da memória.
Neide era como uma árvore frondosa: suas raízes fincadas em Minas, seu tronco erguido em Niterói, seus galhos estendidos para abraçar o Brasil. Sua voz era rio: corria suave, mas firme, levando consigo a seiva da poesia. Seu gesto era ponte: ligava o passado ao futuro, a tradição à inovação, o silêncio à palavra. Ao declamar, Neide não apenas dizia versos: ela os encarnava. Cada poema tornava-se corpo, cada palavra tornava-se respiração. Era como se a poesia, ao passar por sua voz, ganhasse nova vida.
Três anos após seu encantamento, Neide Barros Rêgo permanece viva. Sua memória é celebrada em cada recital, em cada curso, em cada homenagem. Sua arte de dizer continua ecoando, ensinando que a poesia é mais do que escrita: é presença, é gesto, é vida. Neide nos deixou um legado que não se mede em páginas ou prêmios, mas em vozes que continuam a declamar, em corações que continuam a se emocionar, em culturas que continuam a resistir. Ela é, e sempre será, uma mulher extraordinária. Neide é a homenageada da nossa companheira Uyara Schiefer na Coletânea Mulheres Extraordinárias – Volume 4 da Rede Sem Fronteiras, nas páginas 532 a 537.
Neide participou de diversas coletâneas, entre elas a Coletânea Mulheres Extraordinárias – Volume 2, onde dedicou sua homenagem à própria mestra, Maria Sabina de Albuquerque. Sua escrita é marcada por musicalidade, por versos que parecem nascer para serem ditos em voz alta; por força social, entendendo a poesia como instrumento de transformação e resistência; e por sensibilidade feminina, fazendo da palavra espaço de afirmação e de memória das mulheres na cultura. Eleita Intelectual do Ano em 2010, Neide consolidou sua posição como uma das vozes mais importantes da cena cultural fluminense.
Neide Barros Rêgo não foi apenas uma intelectual, mas uma artista da palavra. Sua trajetória revela uma mulher que transitava entre o rigor acadêmico e a sensibilidade artística, entre a política e a poesia. Ao fundar o Centro Cultural Maria Sabina, criou um espaço de resistência e celebração da arte, perpetuando a tradição da declamação e da oralidade poética. Sua participação em coletâneas e homenagens reafirma o papel das mulheres na construção da cultura e da memória. Sua eleição como Intelectual do Ano em 2010 sintetiza sua contribuição à cultura brasileira.
Durante oito anos, Neide Barros Rêgo conviveu com sua mestra Maria Sabina, professora formada em Letras e doutora pela Universidade de Cambridge. Dessa convivência nasceu não apenas admiração, mas uma missão: fundar, em 24 de junho de 1961, o Centro Cultural Maria Sabina, em Niterói, no sobrado da Rua Santos Moreira, nº 52, onde residia e ensinava. Ali, por seis décadas, ministrou o curso “Arte de Dizer” e promoveu encontros líteromusicais que marcaram gerações. Com seu encantamento, o centro encerrou suas atividades, permanecendo intacto, como relicário da memória.
Em sua jornada, Neide integrou o Grupo Momento, no Rio de Janeiro, ao lado de Lise Saint-Clair Pimentel, Dora Nascimento Cambeiro e Sônia Maria Ribeiro, entre 1984 e 1986. No ano seguinte, fundou o Grupo Nuance, com Marly Prates, Gracinha Rego, Aparecida Barreto e Patrícia Faria Santos, todas diplomadas pelo Curso Olavo Bilac. O nome, sugerido por Marly, nasceu durante um recital de música e poesia no Teatro Municipal de Niterói, em outubro de 1985. O grupo percorreu cidades como Angra dos Reis, Campos dos Goytacazes, Cantagalo, Juiz de Fora e Barbacena, encerrando suas atividades após 34 anos, com o falecimento de Marly Prates em 2020.
Neide viveu para a arte, não da arte. Declamou e cantou em diversas cidades brasileiras e também no exterior, França, Áustria, Argentina, levando sua voz e sua alma poética além das fronteiras. Gravou CDs e DVDs que repercutiram dentro e fora do Brasil. Organizou antologias como Água Escondida, 1994, reunindo 234 poetas nascidos ou radicados em Niterói, nome que, em tupi-guarani, significa justamente isso: água escondida.
Sua obra está presente em mais de 150 antologias no Brasil, Portugal e Itália. É verbete na Enciclopédia de Literatura Brasileira de Afrânio Coutinho e J. Galante de Sousa, no Dicionário Biobibliográfico de Escritores Contemporâneos do Estado do Rio de Janeiro de Eduardo Zandron, e no Dicionário Biobibliográfico de Escritores Brasileiros Contemporâneos de Adrião Neto.
Em parceria com Gracinha Rego, organizou a antologia Girassóis para Neusa, 2003. Publicou obras como Poetas Encantados da Niteroiense, 2013, Poetas Encantados da Fluminense, Primeiro Recital, 2017 e Segundo Recital, 2017, celebrando os 70 anos da ANL e os 100 anos da AFL. Em sua trova, deixou o eco de sua missão:
“Os poetas encantados
jamais serão esquecidos
sendo por nós declamados
e, por todos, aplaudidos.”
Sua obra-prima, Revelação: Poesias, 2004, editada por Laplace, foi saudada pelo poeta Armando Vaz como expressão da maturidade poética: “Entre sonetos bem elaborados e outros poemas, o leitor se envolverá com a alma de Neide Barros Rêgo, poetisa por natureza.”
O legado de Neide é múltiplo: na literatura, deixou poemas e textos que continuam a inspirar; na oralidade, perpetuou a Arte de Dizer; na cultura, criou e manteve o Centro Cultural Maria Sabina; na memória coletiva, foi presença constante em grupos como o Nuance; na inspiração feminina, reafirmou o papel das mulheres na construção da cultura e da memória. Neide era como uma árvore frondosa, sua voz era rio, seu gesto era ponte. Ao declamar, Neide não apenas dizia versos: ela os encarnava. Cada poema tornava-se corpo, cada palavra tornava-se respiração. Era como se a poesia, ao passar por sua voz, ganhasse nova vida.
Três anos após seu encantamento, Neide permanece viva. Sua memória é celebrada em cada recital, em cada curso, em cada homenagem. Sua arte de dizer continua ecoando, ensinando que a poesia é mais do que escrita: é presença, é gesto, é vida. Neide nos deixou um legado que não se mede em páginas ou prêmios, mas em vozes que continuam a declamar, em corações que continuam a se emocionar, em culturas que continuam a resistir. Ela é, e sempre será: Declamadora, professora, acadêmica, cantora, esperantista, esposa, mãe e avó, a irmã gêmea de Nilde Barros Diuana, em síntese, uma mulher extraordinária.
NEIDE BARROS RÊGO: A VOZ QUE HABITOU TODAS AS ARTES
Professora, poetisa, declamadora, cantora, esperantista — Neide Barros Rêgo foi uma artista múltipla, cuja trajetória se entrelaça com a própria história cultural de Niterói e do Brasil. Servidora pública por três décadas, atuou na Comissão de Orçamento da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, aposentando-se como Consultora Legislativa. Mas sua missão maior sempre foi a arte, e nela, a palavra dita, cantada, traduzida, encenada.
Formou-se em Administração Pública pela Fundação Getúlio Vargas, estudou Cerimonial no Palácio do Catete e cursou Administração na Faculdade de Ciências Administrativas de Barra Mansa. Transferiu-se para a Faculdade de Ciências Políticas e Econômicas do Rio de Janeiro, sem concluir o curso, pois sua vocação já pulsava em outra direção: a Arte de Dizer. No Curso Olavo Bilac, sob orientação da poetisa Maria Sabina, foi diplomada em declamação e dicção, estudando também Literatura Universal. Com professores como Jair Salles, Emílio Ferreira e Sylla Chaves, mergulhou no Esperanto, idioma que a acompanharia por toda a vida. Tornou-se diretora de cursos do Clube de Esperanto de Niterói, prosseguindo seus estudos com Aloísio Sartorato.
Seu percurso formativo é vasto e impressionante: estudou dicção com Albertina Fortuna Barros na Academia Fluminense de Letras; cursou “Arte de ler e de contar histórias” com Malba Tahan; teatro na Escola de Teatro Comédia do Estado da Guanabara; balé clássico com Lélia do Vale Simões e Tatiana Leskova; balé moderno e folclórico com Frieda Alonso; violão com Celso Ribeiro; impostação vocal com Cloris Galvão Menezes; canto lírico com Masha Tchecova Kellner e Therezinha de Maria Carvalho Pinto; formação de atores com Manduca Quadros.
Fundou, em 24 de junho de 1961, o Curso Maria Sabina de Arte de Dizer, e criou o Centro Cultural Maria Sabina, onde lecionou e promoveu palestras, homenagens, oficinas literárias, laboratórios de memória, cursos livres, lançamentos de livros e recitais. Participou do Grupo Momento, com Lise Saint-Clair Pimentel, Dora Nascimento Cambeiro e Sônia Maria Ribeiro, e fundou o Grupo Nuance com Marly Prates, Aparecida Barreto e Gracinha Rego, todas diplomadas pelo Curso Olavo Bilac.
Neide integrou dezenas de instituições literárias e culturais, entre elas: Academia Fluminense de Letras, Academia Niteroiense de Letras, Academia Nacional de Letras e Artes, Academia de Letras de Conselheiro Lafaiete, Cenáculo Fluminense de História e Letras, Instituto Histórico e Geográfico de Niterói, Academia Brasileira de Trova, Academia Itaocarense de Letras, Academia Gonçalense de Letras, Academia Petropolitana de Poesia Raul de Leoni, Academia Itapirense de Letras, Academia de Letras Menotti Del Picchia, Academia Barbacenense de Letras, Academia Cachoeirense de Letras, Academia Ponta-Grossense de Letras, Academia Varginhense de Letras, Ateneu Angrense de Letras e Artes, Academia de Letras Rio – Cidade Maravilhosa, União Brasileira de Trovadores, Associação Niteroiense de Escritores, Sindicato dos Escritores do Estado do Rio de Janeiro, Grupo Mônaco de Cultura, Universidade Aberta da Terceira Idade, Associação Profissional de Poetas, Associação Universal de Esperanto, Liga Brasileira de Esperanto, Associação dos Esperantistas do Rio de Janeiro, Cooperativa Cultural de Esperantistas e Clube de Esperanto de Niterói.
Recebeu prêmios como intérprete e autora de poemas em português e esperanto, em concursos no Brasil e no exterior, Bulgária, Holanda, Rússia. Atuou como jurada em concursos literários promovidos por academias, faculdades, colégios e pela própria Assembleia Legislativa. Foi agraciada com o Diploma de Melhor do Ano nas Artes Fluminenses (1966), o Título de Cidadã Honorária de Niterói, as Medalhas José Clemente Pereira e José Cândido de Carvalho, a Medalha Tiradentes, a Medalha Austregésilo de Athayde, a Medalha Duque de Caxias, a Medalha Joaquim Nabuco, a Medalha Anita Garibaldi, além de moções da ALERJ, da Câmara Municipal de Niterói e do Rio de Janeiro.
Eleita Intelectual do Ano em 2010 pelo Grupo Mônaco de Cultura, teve textos publicados em revistas acadêmicas e antologias no Brasil, Portugal, Itália, Bulgária, Holanda e Rússia. Sua composição para o poema “Ho, mia kor”, de Lázaro Luiz Zamenhof, teve partitura publicada no Japão. Participou da comissão de redação da Revista da Academia Fluminense de Letras – Volume XVI.
Organizou e publicou a antologia Água Escondida (1994), reunindo 234 poetas niteroienses. Publicou os livros de posse nas academias de Barbacena (1999), Fluminense (2005) e Niteroiense (2010). Com Gracinha Rego, organizou a antologia Girassóis para Neusa (2003). Lançou o livro de poesias Revelação (2004), traduzido para o esperanto. Traduziu também o livro infantil La adiaŭo de la armiloj, de Salvador Borges Filho, ilustrado por Miguel Coelho. Traduziu poemas de Maria Sabina, Carlos Drummond de Andrade, Carlos Alberto dos Santos, Jacy Pacheco, e o conto “Amo, stranga amo”, de Rinaldo Brandão, publicados em revistas do Brasil, Suíça e Rússia.
Gravou depoimento para o projeto “Personalidades de Niterói”, entrevistada por Edmo Rodrigues Lutterbach, Armando Vaz e Marly Prates. Declamou na Academia Brasileira de Letras, na Sala Cecília Meireles, na ABI, em teatros e faculdades. Apresentou-se em Brasília, Fortaleza, Natal, Campo Grande, Belo Horizonte, Barbacena, Juiz de Fora, Vitória, São Paulo, Ribeirão Preto, Curitiba, Porto Alegre, Arouca (Portugal), Viena (Áustria) e Montpellier (França), onde integrou o Coral Internacional sob regência do maestro Dimitar Terziev. Cantou como solista em diversos palcos, entre eles o Teatro Municipal João Caetano, o Teatro da UFF, o Teatro da União dos Professores Primários, o Teatro Câmara Torres, o auditório da CEFET de Campos, o Teatro do SESC-BH, o Teatro Deodoro (Maceió) e o Teatro da Assembleia Legislativa de Porto Alegre.
Neide Barros Rêgo foi uma artista total. Sua vida
foi um palco onde a palavra dançava, cantava, declamava, traduzia e resistia.
Sua memória permanece como um relicário de vozes, como uma partitura de gestos,
como uma constelação de versos que continuam a iluminar a cultura brasileira.
© Alberto Araújo
Focus Portal Cultural
UM MOMENTO SAUDOSO
Uma tarde fria, chove lá fora, vejo, pela vidraça, os pingos da chuva que saltitantes bailam ao movimento do vento, parece um bailado esfuziante! Do escritório ao fundo do apartamento, vinha um som, ouvi vozes cantando uma suave melodia: "Eu sonhei que tu estavas tão linda". Autor: Francisco Matoso e Lamartine Babo, interpretada, brilhantemente, pela declamadora e soprano Neide Barros Rêgo e o barítono Dulcydides de Oliveira Pinto (1933-2016), fala de amor. Por um momento, tenho uma ligeira impressão que o vento está sendo embalado pelo ritmo do piano, tocado pela magnânima Therezinha de Maria Carvalho Pinto, que acompanhava as vozes. Percebi que o Alberto estava exibindo em seu computador o filme que ele gravou na ASPI-UFF, em 26 de novembro de 2015. Corri para assisti-lo, novamente. Na época, foi uma belíssima apresentação.
No momento, senti que tudo entrava em sintonia, o vento empurrando os
pingos da chuva, os pingos, num movimento frenético e a melodia disparou em meu
coração, um sentimento radiante. Senti saudades daquele dia memorável, um
momento inesquecível que nos deu grande prazer!
No instante, roguei ao Pai Celestial pela a alma do saudoso Dulcydides e
pelas vidas, com muita saúde, das nossas magnânimas e doces, Neide Barros Rêgo
e Therezinha de Maria Carvalho Pinto.
SHIRLEY S. LOPES
POSSE DE NEIDE NA ANLA (PRIMEIRA PARTE)
POSSE DE NEIDE NA ANLA (SEGUNDA PARTE)








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