Fotógrafo fez escola com seus jogos de luz e sombra ao registrar nomes como Villa-Lobos.
Maria
Pompeu, também integrante da companhia Os Artistas Unidos, liderada pela
francesa Henriette Morineau, foi diversas vezes retratada por Rosenbauer -
Stefan Rosenbauer / Divulgação
Os
recursos trazidos da Alemanha — entre US$ 1 mil e US$ 2 mil, presume Thomas —
foram suficientes para a montagem do estúdio no Centro do Rio. A barreira da
língua não impediu Rosenbauer de convencer o Copacabana Palace a fazer uma
exposição. E o evento abriu-lhe as portas da cidade. Logo, apareceram os
primeiros clientes. Um deles, o crítico de teatro Van Jafa, faria ponte
fundamental para a carreira do alemão no Brasil. Jafa foi o responsável pela
apresentação do fotógrafo à companhia Artistas Unidos, comandada pela francesa
Henriette Morineau.
A
ascensão do nazismo acendeu luzes vermelhas no estúdio de Frankfurt. O
prestígio acumulado na fotografia na primeira metade dos anos 1930, somado à
conquista de uma medalha no campeonato de esgrima em Varsóvia, garantindo-lhe a
vaga na delegação olímpica, não diminuiu a angústia. A certeza de que não havia
futuro para a sua arte na Alemanha veio na cerimônia de abertura dos Jogos de
Berlim.
—
Meu pai contava que, de tantos aviões de guerra, os céus da capital foram
praticamente ofuscados. Para ele, se Hitler não tomou o cuidado de escondê-los,
é porque a guerra estava muito próxima. Era hora de fugir — narra Thomas
Rosenbauer, único filho do casal, nascido no Brasil, em 1948.
Embora
a empresa Leica, fabricante de máquinas fotográficas pertencente à família
Leitz, produzisse equipamentos para o Exército, e seu patriarca, Ernest, fosse
do partido do Führer, Thomas garante que os proprietários ajudaram judeus a
fugir do país. Os Rosenbauer estavam entre eles. Desesperado desde a “noite dos
cristais”, nome dado aos atos de violência ocorridos na noite de 9 de novembro
de 1938 em diversos locais da Alemanha e da Áustria, com a destruição de
sinagogas, lojas e casas e agressões contra as pessoas identificadas como
judias, o fotógrafo convenceu Ernest Leitz a ajudá-lo:
—
Em janeiro de 1939, Leitz redigiu um documento informando que o meu pai fora
contratado para treinar vendedores e representantes da futura loja que a Leica
abriria no Brasil. Era tudo falso, mas o governo engoliu. Imediatamente, meus
pais embarcaram no Cap Arcona, transatlântico alemão, com passagem só de ida
para o Rio.
—
Meu pai percebeu que os brasileiros gostavam de se mostrar. Mas ele resistiu ao
estilo glamouroso. Preferia captar a essência. Tinha uma técnica toda especial
de eliminar as sombras. As máquinas eram encaixadas num elevador. Ele tinha um
cuidado de focar nos olhos — destaca Thomas.
Para
a capa do livro, “Teatro no Brasil — Os Artistas Unidos fotografados por Stefan
Rosenbauer”, Thomas e sua mulher, Arne, escolheram uma foto de Henriette, quase
uma musa do fotógrafo. Na imagem, o que se vê basicamente são os olhos da
atriz, cercados de sombras só interrompidas para delinear as mechas mais altas
do cabelo.
A
companhia liderada por Madame Morineau fora fundada, em 1946, pelo bancário
Carlos Brant e pelo médico Hélio Rodrigues, que haviam feito um curso de teatro
com a francesa. Durante 13 anos, até a morte de Brant, que extinguiu o grupo,
os Artistas Unidos encenaram um repertório que misturou peças do teatro de
boulevard, textos brasileiros e obras importantes da dramaturgia universal.
Pela
companhia passaram artistas como Beatriz Segall, Maria Clara Machado e Fernanda
Montenegro, todos captados pelas lentes do estúdio do Castelo. No final dos
espetáculos, sempre no Teatro Copacabana, o público costumava parar no foyer
para admirar os portraits, assinados por Rosenbauer. Para Thomas, esse acervo,
conservado graças ao interesse de Paschoal Carlos Magno, que o recolheu após o
fim da companhia, “é provavelmente o único dessa época e se tornou um documento
histórico do teatro nacional”.
—
No Rio, Rosenbauer foi o fotógrafo mais importante e credenciado entre o fim
dos anos 40 e todos os anos 50. As fotos são de extraordinária qualidade. Ele,
como artista, nunca se fechou “na arte fotográfica”, longe de tudo e de todos
os acontecimentos sociais e artísticos do dia a dia. Tinha seu estúdio, a sua
arte, seus admiradores, seguidores, clientes. Ele eternizou e qualificou os
nossos rostos e os nossos instantes felizes para sempre — recorda-se Fernanda
Montenegro.
por
Chico Otavio
03/05/2016
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