A Academia Brasileira de Letras apresenta, através de seu canal de podcast, a série Efemérides Acadêmicas, uma homenagem especial aos noventa anos do nascimento do Acadêmico Ferreira Gullar (1930-2016), eleito em outubro de 2014. O episódio, que irá ao ar no dia 15 de setembro de 2020, a partir das 16h, conta com a participação dos Acadêmicos Arno Wehling, Antonio Carlos Secchin e Antonio Cícero.
Este quinto episódio dá continuidade à série de podcasts em comemoração de aniversários “redondos” de Acadêmicos e celebrará seus feitos e marcos ao longo de suas trajetórias dentro da Casa de Machado de Assis. A emissão está disponível no site da Academia, assim como nas plataformas Apple Podcast, Spotify, Deezer e Castbox.
UM POUCO SOBRE FERREIRA GULLAR
Sétimo ocupante da cadeira nº 37, eleito em 9 de outubro de 2014, na sucessão de Ivan Junqueira, e recebido em 5 de dezembro de 2014, pelo Acadêmico Antonio Carlos Secchin.
Ferreira Gullar, cujo nome verdadeiro era José de Ribamar Ferreira, nasceu em São Luís do Maranhão, MA, em 10 de setembro de 1930, numa família de classe média pobre e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 4 de dezembro de 2016. Dividiu os anos da infância entre a escola e a vida de rua, jogando bola e pescando no Rio Bacanga. Considerava ter vivido numa espécie de paraíso tropical e, quando chegou à adolescência, ficou chocado em ter que tornar-se adulto, e tornou-se poeta.
No começo acreditava que todos os poetas já haviam morrido e somente depois descobriu que havia muitos deles em sua própria cidade, a algumas quadras de sua casa. Passou então, já com seus dezoito anos, a frequentar os bares da Praça João Lisboa e o Grêmio Lítero Recreativo, onde, aos domingos, havia leitura de poemas.
Descobriu a poesia moderna apenas aos dezenove anos, ao ler os poemas de Carlos Drummond de Andrade e Manuel Bandeira. Ficou escandalizado com esse tipo de poesia e tratou de informar-se, lendo ensaios sobre a nova poesia. Pouco depois, aderiu a ela e adotou uma atitude totalmente oposta à que tinha anteriormente, tornando-se um poeta experimental radical, que tinha como lema uma frase de Gauguin: “Quando eu aprender a pintar com a mão direita, passarei a pintar com a esquerda, e quando aprender a pintar com a esquerda, passarei a pintar com os pés”.
Ou seja, nada de fórmulas: o poema teria que ser inventado a cada momento. “Eu queria que a própria linguagem fosse inventada a cada poema”, diria ele mais tarde. E assim nasceu o livro que o lançaria no cenário literário do país em 1954: A luta corporal. Os últimos poemas deste livro resultam de uma implosão da linguagem poética, e provocariam o surgimento na literatura brasileira da poesia concreta, de que Gullar foi um dos participantes e, em seguida dissidente, passando a integrar um grupo de artistas plásticos e poetas do Rio de Janeiro: o grupo neoconcreto.
O movimento neoconcreto surgiu em 1959, com um manifesto escrito por Gullar, seguido da Teoria do não-objeto, estes dois textos fazem hoje parte da história da arte brasileira, pelo que trouxeram de original e revolucionário. São expressões da arte neoconcreta as obras de Lygia Clark e Hélio Oiticica, hoje nomes mundialmente conhecidos.
Gullar, por sua vez, levou suas experiências poéticas ao limite da expressão, criando o livro-poema e, depois, o poema espacial, e, finalmente, o poema enterrado. Este consiste em uma sala no subsolo a que se tem acesso por uma escada; após penetrar no poema, deparamo-nos com um cubo vermelho; ao levantarmos este cubo, encontramos outro, verde, e sob este ainda outro, branco, que tem escrito numa das faces a palavra “rejuvenesça”.
O poema enterrado foi a última obra neoconcreta de Gullar, que se afastou então do grupo e integrou-se na luta política revolucionária. Entre 1962 e 1966 publicou três poemas em estilo de cordel, numa tentativa de alcançar de forma mais direta o leitor popular. Entrou para o Partido Comunista e passou a escrever poemas sobre política e participar da luta contra a ditadura militar que se havia implantado no país, em 1964. Foi processado e preso na Vila Militar. Mais tarde, teve que abandonar a vida legal, passar à clandestinidade e, depois, ao exílio. Deixou clandestinamente o país e foi para Moscou, depois para Santiago do Chile, Lima e Buenos Aires. Em 1976 escreveu o importante ensaio “Augusto dos Anjos ou morte e vida nordestina”, sobre o grande poeta paraibano.
Voltou para o Brasil em 1977, quando foi preso e torturado. Libertado por pressão internacional, voltou a trabalhar na imprensa do Rio de Janeiro e, depois, como roteirista de televisão.
Durante o exílio em Buenos Aires, Gullar escreveu Poema sujo – um longo poema de quase cem páginas – que é considerado a sua obra-prima. Este poema causou enorme impacto ao ser editado no Brasil e foi um dos fatores que determinaram a volta do poeta a seu país. Poema sujo foi traduzido e publicado em várias línguas e países.
De volta ao Brasil, Gullar publicou, em 1980, Na vertigem do dia e Toda poesia, livro que reuniu toda sua produção poética até então. Voltou a escrever sobre arte na imprensa do Rio e São Paulo, publicando, nesse campo, dois livros, Etapas da arte contemporânea (1985) e Argumentação contra a morte da arte (1993), onde discute a crise da arte contemporânea.
Outro campo de atuação de Ferreira Gullar é o teatro. Após o golpe militar, ele e um grupo de jovens dramaturgos e atores fundou o Teatro Opinião, que teve importante papel na resistência democrática ao regime autoritário. Nesse período, escreveu, com Oduvaldo Viana Filho, as peças Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come e A saída? Onde fica a saída? De volta do exílio, escreveu a peça Um rubi no umbigo, montada pelo Teatro Casa Grande em 1978.
Mas Gullar afirmava que a poesia era a sua atividade fundamental. Em 1987, publicou Barulhos e, em 1999, Muitas vozes, que recebeu os principais prêmios de literatura daquele ano. Em 2002, foi indicado para o Prêmio Nobel de Literatura.
A Academia Brasileira de Letras apresenta, através de seu canal de podcast, a série Efemérides Acadêmicas, uma homenagem especial aos noventa anos do nascimento do Acadêmico Ferreira Gullar (1930-2016), eleito em outubro de 2014. O episódio, que irá ao ar no dia 15 de setembro de 2020, a partir das 16h, conta com a participação dos Acadêmicos Arno Wehling, Antonio Carlos Secchin e Antonio Cícero.
Este quinto episódio dá continuidade à série de podcasts em comemoração de aniversários “redondos” de Acadêmicos e celebrará seus feitos e marcos ao longo de suas trajetórias dentro da Casa de Machado de Assis. A emissão está disponível no site da Academia, assim como nas plataformas Apple Podcast, Spotify, Deezer e Castbox.
UM POUCO SOBRE FERREIRA GULLAR
Sétimo ocupante da cadeira nº 37, eleito em 9 de outubro de 2014, na sucessão de Ivan Junqueira, e recebido em 5 de dezembro de 2014, pelo Acadêmico Antonio Carlos Secchin.
Ferreira Gullar, cujo nome verdadeiro era José de Ribamar Ferreira, nasceu em São Luís do Maranhão, MA, em 10 de setembro de 1930, numa família de classe média pobre e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 4 de dezembro de 2016. Dividiu os anos da infância entre a escola e a vida de rua, jogando bola e pescando no Rio Bacanga. Considerava ter vivido numa espécie de paraíso tropical e, quando chegou à adolescência, ficou chocado em ter que tornar-se adulto, e tornou-se poeta.
No começo acreditava que todos os poetas já haviam morrido e somente depois descobriu que havia muitos deles em sua própria cidade, a algumas quadras de sua casa. Passou então, já com seus dezoito anos, a frequentar os bares da Praça João Lisboa e o Grêmio Lítero Recreativo, onde, aos domingos, havia leitura de poemas.
Descobriu a poesia moderna apenas aos dezenove anos, ao ler os poemas de Carlos Drummond de Andrade e Manuel Bandeira. Ficou escandalizado com esse tipo de poesia e tratou de informar-se, lendo ensaios sobre a nova poesia. Pouco depois, aderiu a ela e adotou uma atitude totalmente oposta à que tinha anteriormente, tornando-se um poeta experimental radical, que tinha como lema uma frase de Gauguin: “Quando eu aprender a pintar com a mão direita, passarei a pintar com a esquerda, e quando aprender a pintar com a esquerda, passarei a pintar com os pés”.
Ou seja, nada de fórmulas: o poema teria que ser inventado a cada momento. “Eu queria que a própria linguagem fosse inventada a cada poema”, diria ele mais tarde. E assim nasceu o livro que o lançaria no cenário literário do país em 1954: A luta corporal. Os últimos poemas deste livro resultam de uma implosão da linguagem poética, e provocariam o surgimento na literatura brasileira da poesia concreta, de que Gullar foi um dos participantes e, em seguida dissidente, passando a integrar um grupo de artistas plásticos e poetas do Rio de Janeiro: o grupo neoconcreto.
O movimento neoconcreto surgiu em 1959, com um manifesto escrito por Gullar, seguido da Teoria do não-objeto, estes dois textos fazem hoje parte da história da arte brasileira, pelo que trouxeram de original e revolucionário. São expressões da arte neoconcreta as obras de Lygia Clark e Hélio Oiticica, hoje nomes mundialmente conhecidos.
Gullar, por sua vez, levou suas experiências poéticas ao limite da expressão, criando o livro-poema e, depois, o poema espacial, e, finalmente, o poema enterrado. Este consiste em uma sala no subsolo a que se tem acesso por uma escada; após penetrar no poema, deparamo-nos com um cubo vermelho; ao levantarmos este cubo, encontramos outro, verde, e sob este ainda outro, branco, que tem escrito numa das faces a palavra “rejuvenesça”.
O poema enterrado foi a última obra neoconcreta de Gullar, que se afastou então do grupo e integrou-se na luta política revolucionária. Entre 1962 e 1966 publicou três poemas em estilo de cordel, numa tentativa de alcançar de forma mais direta o leitor popular. Entrou para o Partido Comunista e passou a escrever poemas sobre política e participar da luta contra a ditadura militar que se havia implantado no país, em 1964. Foi processado e preso na Vila Militar. Mais tarde, teve que abandonar a vida legal, passar à clandestinidade e, depois, ao exílio. Deixou clandestinamente o país e foi para Moscou, depois para Santiago do Chile, Lima e Buenos Aires. Em 1976 escreveu o importante ensaio “Augusto dos Anjos ou morte e vida nordestina”, sobre o grande poeta paraibano.
Voltou para o Brasil em 1977, quando foi preso e torturado. Libertado por pressão internacional, voltou a trabalhar na imprensa do Rio de Janeiro e, depois, como roteirista de televisão.
Durante o exílio em Buenos Aires, Gullar escreveu Poema sujo – um longo poema de quase cem páginas – que é considerado a sua obra-prima. Este poema causou enorme impacto ao ser editado no Brasil e foi um dos fatores que determinaram a volta do poeta a seu país. Poema sujo foi traduzido e publicado em várias línguas e países.
De volta ao Brasil, Gullar publicou, em 1980, Na vertigem do dia e Toda poesia, livro que reuniu toda sua produção poética até então. Voltou a escrever sobre arte na imprensa do Rio e São Paulo, publicando, nesse campo, dois livros, Etapas da arte contemporânea (1985) e Argumentação contra a morte da arte (1993), onde discute a crise da arte contemporânea.
Outro campo de atuação de Ferreira Gullar é o teatro. Após o golpe militar, ele e um grupo de jovens dramaturgos e atores fundou o Teatro Opinião, que teve importante papel na resistência democrática ao regime autoritário. Nesse período, escreveu, com Oduvaldo Viana Filho, as peças Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come e A saída? Onde fica a saída? De volta do exílio, escreveu a peça Um rubi no umbigo, montada pelo Teatro Casa Grande em 1978.
Mas Gullar afirmava que a poesia era a sua atividade fundamental. Em 1987, publicou Barulhos e, em 1999, Muitas vozes, que recebeu os principais prêmios de literatura daquele ano. Em 2002, foi indicado para o Prêmio Nobel de Literatura.
Nenhum comentário:
Postar um comentário