quinta-feira, 13 de novembro de 2025

A JANELA DE ICARAÍ - CRÔNICA DE © ALBERTO ARAÚJO

 


Há janelas que se abrem para o mundo. Outras, para dentro de nós. A minha, em Icaraí, faz as duas coisas ao mesmo tempo. É fim de tarde, e o céu parece dividido entre o azul profundo e o dourado que insiste em se despedir devagar.

 

A Praça de Icaraí, logo à frente, se transforma. A Árvore de Natal acende como um feixe de esperança, com seus fios de luz azul e branca desenhando um cone perfeito que desafia a lógica do concreto. No topo, uma estrela brilha como se soubesse exatamente onde estamos, e quem somos.

 

Os sinos da Paróquia São Judas Tadeu tocaram há pouco. Um som angelical, quase tímido, que atravessou o ar como uma oração sem palavras. O letreiro da igreja se acendeu em seguida, como se confirmasse que o tempo agora é outro. Um tempo sagrado, suspenso entre o cotidiano e o milagre. Ali, entre a fé e o restaurante La Mole, onde famílias se reúnem para celebrar o trivial, a vida parece se equilibrar com delicadeza.

 

Do alto da janela, vejo as amendoeiras que margeiam a praça. Suas folhas dançam com o vento que vem do mar, e há algo de ancestral nesse movimento. Como se cada folha soubesse que já foi verão, já foi outono, já foi infância. As crianças correm entre os bancos, os casais se abraçam com a desculpa do frio que nunca chega de verdade, e os velhos observam tudo com olhos que já viram demais.

 

O mar está logo ali, atrás da faixa de areia onde os passos se apagam. Ele respira com calma, como quem sabe que não precisa provar nada. As ondas vêm e vão, indiferentes ao tempo humano, mas cúmplices da nossa saudade. Às vezes, penso que o mar é o único que entende o que sentimos quando olhamos para o Cristo Redentor, lá do outro lado da Baía. Ele está distante, mas presente. Invisível aos olhos apressados, mas evidente para quem sabe olhar com o coração.

 

O Cristo, de braços abertos, parece abraçar não apenas o Rio, mas também Niterói. Como se dissesse: “Eu vejo vocês.” E nós, do lado de cá, respondemos com luzes, com árvores enfeitadas, com sinos que tocam ao entardecer. É uma conversa silenciosa entre fé e beleza, entre o sagrado e o urbano.

 

Informação demais nos atravessa todos os dias. Notícias, alertas, notificações. Mas nenhuma delas é capaz de capturar o que acontece quando a Árvore de Natal se acende na Praça de Icaraí. Nenhum algoritmo entende o que sentimos ao ouvir os sinos da Paróquia São Judas Tadeu. Nenhum feed traduz o cheiro do mar misturado ao perfume das amendoeiras. E nenhum gráfico explica por que, ao olhar para o Cristo Redentor, sentimos que tudo vai ficar bem.

 

A janela é mais do que um enquadramento. É um convite. A paisagem que ela revela não é apenas geográfica, é emocional. É uma cartografia da alma, desenhada com luzes de Natal, com o som dos sinos, com o murmúrio do mar e com a presença silenciosa do Cristo ao longe.

 

Hoje, ao olhar pela janela, entendi que a informação mais importante não está nos jornais, nem nas redes. Está aqui, diante de mim. Está na árvore que brilha, nos sinos que tocam, nas folhas que dançam, no mar que respira, no Cristo que abraça. Está em Icaraí, onde o mundo se revela em detalhes que só o coração é capaz de decifrar.

 

© Alberto Araújo




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