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Em 10 de dezembro de 2020, Clarice Lispector completaria seu
centenário, e em sua homenagem, a TV Cultura preparou este programa especial
para trazer à luz a memória da escritora. Apresentado por Adriana Couto, a
atração traz uma entrevista exclusiva com o biógrafo de Clarice, o professor e
pesquisador norte-americano Benjamim Moser. Além disso, a produção resgata a
última entrevista concedida pela escritora, guiada pelo repórter Julio Lerner,
em 1977, no Panorama. Na conversa com Lerner, ela revela traços importantes de
sua personalidade, que ajudam a compreender quem era aquela mulher, nascida na
Ucrânia, mas que se dizia "brasileira e pernambucana". E a editoria
de toda obra da autora produzida pela editora Secco, em coordenação de Pedro
Vasquez.
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CLARICE LISPECTOR nasceu em Tchelchenik, na Ucrânia, em
1920. Chega ao Brasil com os pais e as duas irmãs aos dois meses de idade,
instalando-se em Recife. A infância é envolta em sérias dificuldades
financeiras. A mãe morre quando ela conta 9 anos de idade. A família então se
transfere para o Rio de Janeiro, onde Clarice começa a trabalhar como
professora particular de português.
A relação professor/aluno seria um dos temas preferidos e
recorrentes em toda a sua obra - desde o primeiro romance: Perto do Coração
Selvagem. Ela estuda Direito, por contingência. Em seguida, começa a trabalhar
na Agência Nacional, como redatora. No jornalismo, conhece e se aproxima de
escritores e jornalistas como Antônio Callado, Hélio Pelegrino, Fernando
Sabino, Paulo Mendes Campos, Alberto Dines e Rubem Braga. Os passos seguintes
são o jornal A Noite e o início do livro Perto do Coração Selvagem - segundo
ela, um processo cercado pela angústia. O romance a persegue. As idéias surgem
a qualquer hora, em qualquer lugar. Nasce aí uma das características do seu
método de escrita - anotar as idéias a qualquer hora, em qualquer pedaço de
papel.
Em 43, conhece e casa-se com Maury Gurgel Valente, futuro diplomata.
O casamento dura 15 anos. Dele nascem Pedro e Paulo. No ano seguinte, ela
publica Perto do Coração Selvagem. Em plena Segunda Guerra Mundial, o casal vai
para a Europa. Perto do Coração Selvagem desnorteia a crítica literaria. Há os
que pretendem não compreender o romance, os que procuram influências - de
Virgínia Wolf e James Joyce, quando ela nem os tinha lido - e ainda os que
invocam o temperamento feminino. Influências?
Perto do Coração Selvagem recebe o prêmio da Fundação Graça
Aranha. Nas palavras de Lauro Escorel, as características do romance revelam
uma "personalidade de romancista verdadeiramente excepcional, pelos seus
recursos técnicos e pela força da sua natureza inteligente e sensível". Já
no primeiro livro, identifica-se o estilo muito pessoal da escritora. Nas
páginas, Clarice explora pela primeira vez a solidão e a incomunicabilidade
humana, através de uma prosa inquieta, próxima da poesia em determinados
momentos.
Rumo à Europa, os Gurgel Valente passam por Natal. De lá
para Nápoles. Já na saída do Brasil, Clarice mostra-se dividida entre a
obrigação de acompanhar o marido e ter de deixar a família e os amigos. Quando
chega à Itália, depois de um mês de viagem, escreve: "Na verdade não sei
escrever cartas sobre viagens, na verdade nem mesmo sei viajar."
Clarice permanece em Nápoles até 1946. Durante a II Guerra,
presta ajuda num hospital de soldados brasileiros. Uma dúvida: um serviço
prestado como cidadã brasileira ou como mulher de um diplomata brasileiro? Como
escritora, ela sente a presença do sucesso. Por telegrama, sabe do prêmio
recebido pelo romance deixado no Brasil. Mantém uma correspondência constante
com os amigos que deixara para trás. Em Nápoles, em 44, conclui O Lustre, livro
iniciado no Brasil e que seria publicado em 1946. Virgínia, a personagem
principal de O Lustre, tem a história narrada desde a infância e também aparece
sob o signo do mal, tal como Joana, personagem do primeiro romance. Em O
Lustre, Virgínia mantém um relacionamento incestuoso com o irmão, Daniel, com
quem faz reuniões secretas em que experimentam verdades, na condição de
iniciados especiais. Nessa época, Clarice Lispector se corresponde com Lúcio
Cardoso, que não gosta do título do livro: acha-o "mansfieldiano" e
um pouco pobre para pessoa tão rica como Clarice.
No fim da guerra, Clarice é retratada por De Chirico. Em
maio de 45, ela manda uma carta às irmãs Elisa e Tânia, contando o encontro com
o artista e falando sobre o final da guerra na Europa.
Quando O Lustre é lançado, Clarice está no Brasil, onde
passa um mês. De volta à Europa, transfere-se para a Suiça, "um cemitério
de sensações", segundo a escritora. Durante três anos, passa por
dificuldades em relação à escrita e à vida pessoal. Em 46, tenta iniciar A
Cidade Sitiada, livro que sairia em 49. Vendo-se impossibilitada de escrever,
coleciona frases de Kafka, referentes a preguiça, impaciência e inspiração.
Para Clarice, a vida em Berna é de miséria existencial. A
Cidade Sitiada acaba sendo escrito na Suíça. Na crônica "Lembrança de uma fonte,
de uma cidade", Clarice afirma que, em Berna, sua vida foi salva por causa
do nascimento do filho Pedro e por ter escrito um dos livros "menos
gostados". Terminado o último capítulo, dá à luz. Nasce então um
complemento ao método de trabalho. Ela escreve com a máquina no colo, para
cuidar do filho.
"Não pense que a pessoa tem tanta força assim a ponto
de levar qualquer espécie de vida e continuar a mesma. Até cortar os defeitos
pode ser perigoso - nunca se sabe qual o defeito que sustenta nosso edifício
inteiro...há certos momentos em que o primeiro dever a realizar é em relação a
si mesmo. Quase quatro anos me transformaram muito. Do momento em que me
resignei, perdi toda a vivacidade e todo interesse pelas coisas. Você já viu
como um touro castrado se transforma em boi. Assim fiquei eu...Para me adaptar
ao que era inadaptável, para vencer minhas repulsas e meus sonhos, tive que
cortar meus grilhões - cortei em mim a forma que poderia fazer mal aos outros e
a mim. E com isso cortei também a minha força. Ouça: respeite mesmo o que é
ruim em você - respeite sobretudo o que imagina que é ruim em você - não copie
uma pessoa ideal, copie você mesma - é esse seu único meio de viver. Juro por
Deus que, se houvesse um céu, uma pessoa que se sacrificou por covardia ia ser
punida e iria para um inferno qualquer. Se é que uma vida morna não é ser
punida por essa mesma mornidão. Pegue para você o que lhe pertence, e o que lhe
pertence é tudo o que sua vida exige. Parece uma vida amoral. Mas o que é
verdadeiramente imoral é ter desistido de si mesma. Gostaria mesmo que você me
visse e assistisse minha vida sem eu saber. Ver o que pode suceder quando se
pactua com a comodidade da alma." - Clarice Lispector, em carta. Berna –
Suiça, 1947.
O período na Suíça caracteriza-se pela saudade do Brasil,
dos amigos e das irmãs. A correspondência que recebe não lhe parece suficiente.
Até 52, escreveria contos, gênero em que Clarice Lispector talvez não tenha
sido alcançada na literatura brasileira. Alguns Contos foi publicado em 52,
quando ela já tinha deixado Berna, passado seis meses na Inglaterra e partido
para os Estados Unidos, acompanhando o marido.
Em carta às irmãs, em janeiro de 47, de Paris, Clarice expõe
seu estado de espírito... Em 95, o escritor Caio Fernando Abreu, então
colunista do jornal O Estado de São Paulo, publicou uma carta que teria sido
escrita por Clarice Lispector a uma amiga brasileira. Ele comenta, no artigo,
que não há nada que comprove sua autenticidade, a não ser o estilo-não estilo
de escrita de Clarice Lispector. Ele dizia: "A beleza e o conteúdo de
humanidade que a carta contém valem a pena a publicação..."
Em 1950, na Inglaterra, Clarice inicia o esboço do que viria
a ser A Maçã no Escuro, livro publicado em 61. Antes de se fixar em Washington
ela passa pelo Brasil. Trabalha novamente em jornais, entre maio e setembro de
52, assinando a página "Entre Mulheres", no jornal O Comício, no Rio,
sob o pseudônimo de Tereza Quadros. Em setembro vai para os Estados Unidos,
grávida. Durante os oito anos de permanência no país, vem ao Brasil várias
vezes. Em fevereiro de 53, nasce Paulo. Ela continua a escrever A Maçã no
Escuro, em meio a conflitos domésticos e interiores. Mãe, Clarice Lispector
divide seu tempo entre os filhos, A Maçã no Escuro, os contos de Laços de
Família e a literatura infantil. O primeiro livro para crianças seria O
Mistério do Coelhinho Pensante, uma exigência do filho Paulo. A obra ganharia o
prêmio Calunga, em 67, da Campanha Nacional da Criança. Ela ainda escreveria
três livros infantis: A Mulher que Matou os Peixes, A Vida Íntima de Laura e
Quase de Verdade. Nos Estados Unidos, Clarice Lispector conhece Erico e Mafalda
Verissimo, dos quais torna-se grande amiga.
Veríssimo e família retornam ao Brasil em 56. Entre os
escritores, inicia-se uma vasta correspondência. No primeiro semestre de 59, o
casal Gurgel Valente decide-se pela separação. Clarice volta a morar no Rio de
Janeiro, com os filhos. Sobre o "conciliar" casamento/literatura,
afirmava que escrevia de qualquer maneira, mas o fato de cumprir o seu papel
como mulher de diplomata sempre a enjoou muito. Cumpria a obrigação. Nada além.
Na volta ao país, mais um período de dificuldades afetivas e financeiras. Ela
prefere a solidão ao círculo que tinha relação com o ex-marido. O dinheiro que
recebia como pensão não era suficiente, nem os recursos arrecadados com
direitos autorais. Clarice retorna ao jornalismo. Escreve contos para revista
Senhor, torna-se colunista do Correio da Manhã, em 59, e, no ano seguinte,
começa a assinar a coluna Só para Mulheres, como "ghost writer" da
atriz Ilka Soares no Diário da Noite. A atividade jornalística seria exercida
até 1975. No final dos anos 60, Clarice faz entrevistas para a revista
Manchete. Entre 67 e 73 mantém uma crônica semanal no Jornal do Brasil, e,
entre 75 e 77, realiza entrevistas para a Fatos e Fotos.
A década de 60 principia com a publicação do livro de contos
Laços de Família. Seguir-se-iam as publicações de A Maçã no Escuro, em 61,
livro que recebeu o Prêmio Carmen Dolores Barbosa, A Legião Estrangeira, em 62,
e A Paixão Segundo G.H., em 64.
Uma escultora de classe alta, que mora num apartamento de
cobertura num edifício do Rio, resolve arrumar o quarto de empregada, cômodo
que supõe, seja o mais sujo da casa, o que não é verdade. O quarto é claro e
límpido. Entre várias experiências desmistificatórias, a crucial: abre a porta
do guarda-roupa e se vê diante de uma barata. Embora afirme que o livro não tem
nada de experiência pessoal, admite que a obra fugira do seu controle...
Entre 65 e 67, Clarice dedica-se à educação dos filhos e com
a saúde de Pedro, que apresenta um quadro de esquizofrenia, exigindo cuidados
especiais. Apesar de traduzida para diversos idiomas e da republicação de
diversos livros, a situação econômica de Clarice é muito difícil. Em setembro
de 67, acontece o acidente que deixa marcas no corpo e na alma da escritora -
um incêndio no quarto que ela tenta apagar com as mãos. Fica gravemente ferida,
passa 3 dias entre a vida e a morte. Três dias definidos por ela como
"estar no inferno."
Em 69, publica o romance Uma Aprendizagem ou O Livro dos
Prazeres. Em 71, a coletânea de contos Felicidade Clandestina, volume que
inclui O Ovo e a Galinha, escrito sob o impacto da morte do bandido Mineirinho,
assassinado pela polícia com treze tiros, no Rio de Janeiro.
Os últimos anos de vida são de intensa produção: A Imitação
da Rosa (contos) e Água Viva (ficção), em 1973; A Via Crucis do Corpo (contos)
e Onde Estivestes de Noite, também contos, em 74. Visão do Esplendor
(crônicas), em 75. Nesse ano, é convidada a participar, em Bogotá, do Congresso
Mundial de Bruxaria. Sua participação limita-se à leitura do conto O Ovo e a
Galinha. No ano seguinte, Clarice Lispector recebe o 1° prêmio do X Concurso
Literário Nacional, pelo conjunto da obra.
Em 77, concede entrevista à TV Cultura, com o compromisso de
só ser transmitida após a sua morte. Ela antecipa a publicação de um novo
livro, que viria a se chamar A Hora da Estrela, adaptado para o cinema nos anos
80 por Suzana Amaral.
Clarice morre, no Rio, no dia 9 de dezembro de 1977, um dia
antes do seu 57° aniversário. Queria ser enterrada no Cemitério São João
Batista, mas era judia. O enterro aconteceu no Cemitério Israelita do Caju.
Postumamente, foram publicados Um Sopro de Vida, Para Não Esquecer e A Bela e a
Fera.
Fonte
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