TEXTO DE GUTO MELLO
12-05-2022 - Hoje, eu vou ser aforista em relação à obra do grande amigo e historiador Adelci Santos que lançou esse belíssimo e robusto trabalho, sobre a escravidão no Vale do Paraíba Fluminense no século XIX. Como um detetive sedento de informações, pesquisou fontes primárias (arquivos) e secundárias (livros) em Piraí e Vassouras como um espaço geográfico que colocou a economia brasileira durante o Império no primeiro escalão com a produção de café.
Durante a minha leitura eu não pude deixar de pensar nos filósofos Karl Marx e Jean-Paul Sartre. O primeiro publicou a obra "O Capital", obra essa que foi fundamental para entendermos o materialismo histórico e as relações de força entre as elites e os desafortunados. Adelci mapeia as ações tomadas de diferentes formas entre os senhores e seus escravos e por isso vejo a obra forjada entre o marxismo cultural e a Escola dos Annales (1929-1989) por estarmos diante dos elementos sociológicos, antropológicos, geográfico e histórico. Os arquivos enquanto fontes históricas nos transportam para o século XIX sem correr o risco de cairmos na armadilha do anacronismo. Cito também Sartre dentro da linha existencial quando um escravo não é um cidadão segundo José Murilo de Carvalho, mas sim, um objeto.
Os diversos retratos dos oitocentos encontram-se nos testamentos dos "Barões do Café" dando alforria para escravas que tiveram filhos e filhas com os seus senhores, terras a perder de vista, café e escravos. Era o método das escravas que viravam a cabeça dos seus senhores através do gingado e sensualidade criando talvez até ternura dos senhores com as escravas de sua preferência. Ao invés de usarem a fuga, usaram o sexo como uma "moeda de troca" para a alforria após o falecimento do seu senhor.
Em sua pesquisa, Adelci cita Xica da Silva, mulher que buscou nas Minas Gerais ascensão social com atividade sexual. O amigo Adelci é um historiador sério e não pode ter base através das conjecturas, mas com os fatos históricos, no entanto, não podemos descartar a História Oral e a vida sexual da Xica pode ter chegado aos ouvidos das escravas em Piraí e Vassouras, porém são só conjecturas. Nem todo senhor teve uma relação aparentemente consentida pela escrava. Muitos senhores estupraram suas escravas, uma violência sexual que deixava marcas profundas na alma delas e marcas no corpo caso não atendessem o predador sexual.
Enfim, esse livro que é a Tese de Doutorado pela UERJ do Adelci, é um daqueles livros que precisam sempre estar ao seu alcance para uma releitura e entendermos um mosaico de relações sociais e culturais entre a Casa Grande e a Senzala. É inegável que a obra do nobre historiador vai fazer parte dos anais da História da Historiografia sobre o Vale do Café Fluminense. Um leitor que queira conhecer a História dos oitocentos e um historiador que tem como tempo histórico o "longo século XIX" (1780-1930) para as suas pesquisas, não pode deixar de ler essa obra. Mais do que nunca, eu recomendo!
GUTO MELLO é historiador, membro da
AVL - Academia Volta-Redondense de Letras, da Rede Sem Fronteiras e da ALALS -
Acadèmie de Lettres et Arts Luso-Suisse.
SOBRE A OBRA
Detalhes do produto
Editora : Estudos Americanos; 1ª
edição (24 março 2022)
Idioma : Português
Capa comum : 280 páginas
ISBN-10 : 8554161157
ISBN-13 : 978-8554161156
Dimensões : 16 x 0.05 x 23 cm
Lançado em abril, o livro do
historiador ADELCI SILVA DOS SANTOS sob o título “A CAMINHO DA LIBERDADE:
ESTRATÉGIAS DE ALFORRIA NO VALE DO PARAÍBA FLUMINENSE NO SÉCULO XIX”.
O livro apresenta a possibilidade de que o leitor conheça uma das características mais marcantes do século XIX: A escravidão. A busca pela liberdade chama a atenção para cenas pouco conhecidas do público em geral, como o surgimento de negras proprietárias de terras, de dinheiro e de outros escravos. Se por um lado a lenda dos negros reprodutores é uma fantasia, muito presente no imaginário brasileiro, as escravas de alcova são pouco reconhecidas e abandonadas no esquecimento. Neste livro, o autor as coloca no palco social, ao revelar, de forma clara e instigante, ações e estratégias com o objetivo de abandonar o cativeiro. Ao contar as histórias de mulheres como Laura, Francisca e América, resgata as mulheres cativas como protagonistas dos próprios destinos, que transformaram fatalidades em oportunidades para abandonar as senzalas e fazer parte de uma sociedade na qual, ser livre, é a primeira exigência para a aceitação enquanto pessoa. Ler “A Caminho da Liberdade” é mergulhar na sociedade senhorial do século XIX e observar a caminhada de personagens singulares em busca da conquista da condição humana por meio da libertação do cativeiro.
Fruto da tese de doutorado de Adelci
apresentada na Universidade do Estado do Rio de Janeiro em 2020, o livro traz
um estudo de forma sistemática e vertical de alguns dos caminhos que conduziram vários dos
cativos, mas especificamente das cativas, do Vale do Paraíba Fluminense, à
liberdade. Para isso, o autor consultou aproximadamente 470 testamentos do
Arquivo Municipal de Piraí, além de outros 116 do acervo do extinto Centro de
Documentação Histórica de Vassouras. Inventários e Processos Criminais também
se somaram à pesquisa por se entender que, estudar as liberdades e as alforrias
apenas pelas Cartas de Liberdade criaria uma imagem muito nua destes
benefícios, não permitindo perceber as reais motivações que se escondiam por
trás destas doações. As fontes, e os dados delas levantados, foram analisados
sob a lupa da Etno-História, com a ajuda da História Cultural e da
Micro-História, com o objetivo de melhor compreender as dinâmicas envolvidas
nas relações de poder que se estabeleceram entre as mulheres cativas e seus
senhores no embate pela conquista ou concessão da liberdade, bem como mensurar
os resultados materiais deste embate. É possível perceber que muitas mulheres
escravas, uma vez sob o domínio sexual de seus senhores, e sem outra escolha
possível à vista, fizeram desta condição desfavorável, uma oportunidade de
minimizar os rigores da escravidão e, por vezes, essa resiliência resultou na
obtenção da alforria, no recebimento de bens de pequena monta ou de grandes
valores, plantações, terras e imóveis, tanto para si quanto para os filhos
nascidos no cativeiro, invariavelmente, resultado das investidas sexuais de
seus proprietários.
ALDECI possui graduação em História
pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Vassouras(1991) e mestrado em
História pela Universidade Severino Sombra (1999). Possui também Doutorado em
História pelas Universidade Estadual do Rio de Janeiro, e Universidade Federal
do Rio de Janeiro atuando principalmente nos seguintes temas: escravidão,
africanidade, economia agrícola, povoamento, século XIX. Atualmente o autor
está fazendo seu pós doutorado na UERJ.
O leitor que desejar adquirir um
exemplar pode entrar em contato diretamente com o autor por meio do WhatsApp (24)
99868-7836.
Nenhum comentário:
Postar um comentário