quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

A CIDADE SITIADA – CLARICE LISPECTOR | A OBRA INDICADA DO FOCUS PORTAL CULTURAL

 


A CIDADE SITIADA faz parte do conjunto de três romances que Clarice Lispector escreveu antes de completar 30 anos. O primeiro, Perto do coração selvagem, foi lançado no ano em que ela se casou 1943, o terceiro, no ano em que teve o primeiro filho, 1949. O livro A cidade sitiada é ambientado no subúrbio de São Geraldo, durante a década de 1920, e é neste lugar pouco atraente que vive Lucrécia Neves, uma jovem simplória que apenas vê a vida passar... Possui narrativa em terceira pessoa e estrutura linear. Lucrécia e São Geraldo são inseparáveis e indistinguíveis ao longo da trama. No processo de buscar conhecer a si mesma, Lucrecia se exterioriza, tudo o que ela sabe de si é o que ela vê ao seu redor. Até por isso, Clarice não utiliza aqui o fluxo de consciência. O "ser" não está no pensamento e sim no olhar.

Em 1971, Clarice Lispector disse ao jornal Correio da Manhã que A cidade sitiada, de 1949, foi seu livro mais difícil de escrever. Talvez porque, na história de Lucrécia Neves, o talento de Clarice tenha levado à perfeição o paradoxo de desumanizar ao máximo seus personagens para torná-los visceralmente humanos. A simplória protagonista Lucrécia, docemente desprovida de raciocínio e/ou de consciência, é alma gêmea de Macabéa, de A hora da estrela. Lucrécia é apenas o que ela vê: os cavalos a esmo na suburbana cidade natal de São Geraldo, o morro do Pasto, o armazém, o sol sem vento da tarde. Lucrécia portanto era São Geraldo. Sua alma, suas emoções eram o tédio do subúrbio. Ela tinha um vago desejo de se casar e, por isto, passeava com o tenente Felipe, do qual gostava da farda militar, mas ele não gostava de São Geraldo, logo não gostaria de Lucrécia. Saía com Perceu Maria, que desprezava talvez por ser atônito e vazio como ela. Mas nenhum dos dois a pedia em casamento e, quando a agonia do coração de Lucrécia batia em descompasso com a modorra da cidade, ela sonhava com um baile. Um baile com música e danças seria a salvação. Por pura catatonia, restou a Lucrécia o casamento com Mateus Correia, comerciante rico e bem mais velho, por iniciativa da mãe, Ana, à qual não oferecera entusiasmo ou resistência. Depois do casamento, Lucrécia continuou a ver diariamente o movimento do trânsito, da construção de um viaduto, das aranhas fazendo suas teias, os mosquitos. Via o marido e suas preocupações domésticas. Amava-o? Depois da morte de Mateus, Lucrécia, menos sitiada, mas ainda não liberta, vai à busca de um homem de bom coração. Mas para ela o amor era difícil. Ela não o via e, portanto, não sabia o que era o amor. A cidade sitiada, como os demais títulos de Clarice Lispector relançados pela Rocco, recebeu novo tratamento gráfico e passou por rigorosa revisão de texto, feita pela especialista em crítica textual Marlene Gomes Mendes.

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