Tenho
um livro sobre águas e meninos.
Gostei
mais de um menino
que
carregava água na peneira.
A
mãe disse que carregar água na peneira
era
o mesmo que roubar um vento e
sair
correndo com ele para mostrar aos irmãos.
A
mãe disse que era o mesmo
que
catar espinhos na água.
O
mesmo que criar peixes no bolso.
O
menino era ligado em despropósitos.
Quis
montar os alicerces
de
uma casa sobre orvalhos.
A
mãe reparou que o menino
gostava
mais do vazio, do que do cheio.
Falava
que vazios são maiores e até infinitos.
Com
o tempo aquele menino
que
era cismado e esquisito,
porque
gostava de carregar água na peneira.
Com
o tempo descobriu que
escrever
seria o mesmo
que
carregar água na peneira.
No
escrever o menino viu
que
era capaz de ser noviça,
monge
ou mendigo ao mesmo tempo.
O
menino aprendeu a usar as palavras.
Viu
que podia fazer peraltagens com as palavras.
E
começou a fazer peraltagens.
Foi
capaz de modificar a tarde botando uma chuva nela.
O
menino fazia prodígios.
Até
fez uma pedra dar flor.
A
mãe reparava o menino com ternura.
A
mãe falou: Meu filho você vai ser poeta!
Você
vai carregar água na peneira a vida toda.
Você
vai encher os vazios
com
as suas peraltagens,
e
algumas pessoas vão te amar
por
seus despropósitos!
UM
POUCO SOBRE MANOEL DE BARROS
Manoel
Wenceslau Leite de Barros foi um dos grandes poetas brasileiros do século XX.
Nascido na cidade de Cuiabá, no Mato Grosso, em 19 de novembro de 1916,
mudou-se para Campo Grande ainda criança. Quando mais velho, foi para o Rio de
Janeiro terminar os estudos e estudar Direito. Como poeta, foi representante do
pós-Modernismo brasileiro, apesar de ter sido influenciado por Oswald de
Andrade e o movimento antropofágico.
Logo aos 21 anos, Manoel de Barros publicou o seu primeiro livro, “Poemas concebidos sem pecado” (1937), seguido por “Face imóvel” (1942). Essas e tantas outras obras lhe renderam prêmios importantes na literatura brasileira, como dois Prêmios Jabuti (1989 e 2002) e o Prêmio da Academia Brasileira de Letras (2012), concedido aos autores dos melhores livros de poesia.
Abaixo, um belo poema do escritor sobre a arte e seus despropósitos, publicado em 1999, no livro “Exercícios de ser criança”.
Aos
97 anos, em 2014, Manoel faleceu na cidade de Campo Grande/MS, sendo consagrado
um dos mais importantes poetas brasileiros do século XX.
“O MENINO QUE CARREGAVA ÁGUA NA PENEIRA”
- MANOEL DE BARROS – DECLAMAÇÃO DE ODILON
ESTEVES.
CLICAR
NO LINK: https://www.youtube.com/watch?v=JWRMUk4nzR0
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