domingo, 14 de dezembro de 2025

MAGDA BELLOTI - A VOZ QUE EMBELEZOU A CONSAGRAÇÃO DE ERTHAL ROCHA CRÔNICA DE © ALBERTO ARAÚJO

Na manhã de 13 de dezembro de 2025, o Salão Nobre da Academia Fluminense de Letras foi mais do que cenário de uma solenidade. Tornou-se palco de uma experiência estética que uniu palavra e música, razão e emoção, memória e futuro. Se a entrega do título de Intelectual do Ano a Célio Erthal Rocha já era, por si só, um ato de consagração, a presença da soprano Magda Belloti transformou o momento em espetáculo completo, coroando a celebração com a força da arte. 

Magda, integrante do corpo estável do Coro do Theatro Municipal do Rio de Janeiro e solista de destaque na cena lírica carioca, trouxe ao salão não apenas sua voz cristalina, mas também sua história. Cada nota que entoou parecia dialogar com a trajetória do homenageado, como se a música fosse a tradução estética de sua vida. A solenidade, que já reunia juristas, escritores, jornalistas e familiares, ganhou uma dimensão lírica que a inscreveu na memória coletiva da cidade.

A cantora iniciou sua participação com clássicos da música popular brasileira, escolhidos com delicadeza para refletir o espírito da ocasião. “Modinha”, de Sérgio Bittencourt, trouxe a melancolia suave das canções que falam de amor e tempo. Em seguida, “Carinhoso”, de Pixinguinha e Braguinha, ecoou como um abraço sonoro, lembrando que a cultura brasileira é feita de afetos e de melodias que atravessam gerações. 

Mas foi ao interpretar “My Way” que Magda deu ao evento sua dimensão universal. A canção, composta por Claude François e Jacques Revaux, com letra adaptada por Paul Anka para Frank Sinatra, tornou-se símbolo da autonomia, da coragem de viver segundo a própria consciência. Ao entoar seus versos, Magda não apenas cantava: ela oferecia ao público uma metáfora da vida intelectual de Célio Erthal Rocha. 

Assim como na música, Erthal seguiu seu caminho, fez suas escolhas, enfrentou desafios e construiu uma trajetória singular. My Way tornou-se, naquele instante, a síntese da celebração: a objetividade da canção se unia à subjetividade da homenagem, transformando a solenidade em rito de consagração. 

O repertório se encerrou com “Aquarela do Brasil”, de Ary Barroso, hino da brasilidade que reafirmou o vínculo entre o homenageado e sua terra. A música, vibrante e luminosa, foi como um brinde final à cultura que Erthal sempre defendeu e representou. 

Magda Belloti não cantou apenas músicas. Cantou sua própria história. Emocionada, lembrou que o primeiro a acreditar em sua trajetória cultural foi o livreiro Carlos Mônaco, personalidade há muito central na vida cultural de Niterói, e a saudosa artista Ângela Gemesio. Recordou o gesto de Mônaco, que, em 18 de novembro de 1994, pegou sua mão e disse: “Eu acredito em você, na sua potência, você tem o brilho de cantar no teatro.”

Naquele dia, Mônaco a apresentou no Theatro Municipal de Niterói, inaugurando uma carreira que hoje se consagra como uma das mais importantes da cena lírica carioca. Ao compartilhar essa memória, Magda não apenas agradeceu: ela reafirmou que a cultura é feita de encontros, de mãos estendidas, de confiança que se transforma em arte. 

O título de Intelectual do Ano concedido a Célio Erthal Rocha encontrou em My Way sua tradução simbólica. A música fala de escolhas, de caminhos percorridos com coragem, de vidas vividas com autenticidade. É exatamente isso que define o intelectual: alguém que não se curva às convenções, que constrói sua trajetória com independência, que se mantém fiel à sua consciência.

Ao cantar My Way, Magda Belloti não apenas homenageou Erthal. Ela deu voz ao conceito de intelectualidade. Sua interpretação foi aplaudida não apenas pela beleza da execução, mas pela pertinência da escolha. Cada verso parecia ecoar a vida do homenageado: um homem que, aos 94 anos, continua ativo, lúcido e presente, reafirmando que a intelectualidade é, antes de tudo, um modo de viver. 

Naquele salão, duas trajetórias se encontraram: a do intelectual e a da cantora. Erthal, com sua vida dedicada à palavra e à justiça; Magda, com sua voz dedicada à música e à emoção. Ambos representam a força da cultura como elemento transformador.

Magda foi, naquela manhã, mais do que intérprete. Foi a diva que deu à solenidade sua dimensão estética, que transformou o ato protocolar em espetáculo, que fez da homenagem um momento de beleza e transcendência. Sua voz cristalina e poderosa não apenas encantou: consagrou. 

Ao final da cerimônia, entre aplausos e lágrimas discretas, ficou claro que a homenagem a Célio Erthal Rocha não se limitou à entrega de uma placa. Foi uma celebração completa, em que a palavra e a música se uniram para consagrar uma vida. 

Magda Belloti, com sua interpretação de My Way, ofereceu ao público a síntese da intelectualidade: viver segundo a própria consciência, construir um caminho único, transformar a vida em obra. Sua voz, naquele instante, tornou-se referência criativa, símbolo da união entre arte e pensamento. 

E assim, no Salão Nobre da Academia Fluminense de Letras, a solenidade se transformou em crônica viva: a história de um intelectual celebrada pela voz de uma diva. 











Na oportunidade, trago também ao público minha própria gratidão e testemunho. Recordo que, há muitos anos, em 2011, o livreiro Carlos Mônaco acreditou em meu trabalho quando eu frequentava os eventos no Calçadão da Cultura, promovidos pela Livraria Ideal, de sua propriedade. Em gesto generoso, Mônaco chegou até mim e disse que acreditava em minha potencialidade. Foi então que me confiou a página do Grupo Mônaco de Cultura no Jornal Literato para que eu a editasse. 

A experiência foi fecunda: conseguimos produzir inúmeras páginas, dando voz a escritores, artistas e pensadores. O Jornal Literato era publicado pela Imprensa Oficial do Estado do Rio de Janeiro (IOERJ), também conhecida pelo nome fantasia Nova Imprensa Oficial, dirigida à época por Haroldo Zager Faria Tinoco. Haroldo, personalidade de grande envolvimento cultural, trabalhou por muitos anos na IOERJ, ocupando cargos e promovendo eventos. Foi ele com apoio integral do governo do estado, quem abriu a Sala de Cultura Leila Diniz, inaugurada em 1º de julho de 2011, espaço que se tornou referência de liberdade de expressão e apoio à produção artística. 

A Sala, mantida pela própria IOERJ, contou com a participação de nomes como a cineasta Janaína Diniz Guerra, filha de Leila Diniz, que a descreveu como um lugar de liberdade e criação. Era, e continua sendo, um equipamento do Governo do Estado para fomentar a arte, um espaço que simboliza a resistência cultural e a valorização da memória.

Ao relembrar esse momento, reafirmo minha gratidão a Carlos Mônaco, que acreditou em mim e me ofereceu oportunidade de contribuir com a cultura fluminense. Esse depoimento pessoal se soma ao da Diva Magda Belloti, pois ambos os testemunhos revelam que a cultura se constrói não apenas com grandes solenidades, mas também com gestos de confiança, encontros e mãos estendidas.

© Alberto Araújo

Focus Portal Cultural










 

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