Os cabelos, outrora cachoeira escura ou cascata dourada, agora se adornam da alva geada do tempo, fios de prata que brilham à luz de incontáveis auroras e poentes. As mãos, que embalaram sonhos tenros e teceram a lida de tantos dias, ostentam a cartografia sutil das veias, rios de uma jornada longa e sinuosa. O corpo, talvez já não responda com a mesma agilidade da juventude, carrega em cada linha, em cada curva, a memória de risos e lágrimas, de abraços apertados e despedidas sentidas.
Mas não se engane o olhar apressado que vê apenas o declínio. Pois na lentidão dos passos reside a firmeza de quem já trilhou caminhos incertos e superou obstáculos íngremes. Nas rugas que emolduram o rosto, não há apenas o sulco do tempo, mas a gravação indelével de histórias vividas, de sabedorias colhidas em cada estação da existência.
A velhice não é o ocaso, mas um
entardecer sereno, onde a luz suave revela nuances antes ocultas. É o tempo da
contemplação, do balanço feito com a clareza de quem observa a vida de uma
colina, com a perspectiva que só os anos podem oferecer. Os olhos, por vezes
marejados pela saudade, cintilam com a compreensão profunda da natureza humana,
com a aceitação das imperfeições e a celebração das pequenas alegrias.
A voz, talvez embargada pela emoção ou pelo cansaço, ecoa com a ressonância da experiência. Em cada palavra proferida, há um conselho silencioso, uma lição aprendida na escola implacável do tempo. São narrativas que embalam as novas gerações, que conectam o passado ao presente, que semeiam a esperança no futuro.
A alma do ancião é um relicário de vivências, um tesouro de conhecimentos acumulados, de erros que ensinaram e de acertos que fortaleceram. É a biblioteca viva de uma época, um farol que ilumina a travessia daqueles que ainda navegam nas águas turbulentas da juventude e da maturidade.
Assim como Liev Tolstói escritor,
William Shakespeare que teceram em seus escritos a delicadeza da alma humana e
a beleza efêmera do tempo, a velhice se apresenta como um poema silencioso,
rico em metáforas e significados. Não é o fim da jornada, mas uma nova estrofe,
escrita com a tinta da sabedoria e adornada com a paciência que só os anos
podem conceder. É o ouro silencioso dos anos, a herança imaterial que enriquece
a tapeçaria da vida com fios de rara beleza e inestimável valor.
© Alberto Araújo
Niterói, janeiro de 2020.
OUTROS AUTORES QUE TECERAM IDEIA SOBRE A VELHICE
William Shakespeare: Em várias de suas
peças, como "Rei Lear" e "As You Like It", Shakespeare explora
as diferentes fases da vida, incluindo a velhice, com suas perdas, sabedorias e
desafios. O famoso discurso de Jaques em "As You Like It" ("All
the world's a stage...") oferece uma visão melancólica das etapas da vida,
culminando na "decrepitude e velhice esquecida".
Liev Tolstoy: Em obras como "A Morte de Ivan Ilitch", Tolstoy examina a fragilidade da vida e a inevitabilidade da morte, muitas vezes refletindo sobre a perspectiva de personagens idosos confrontando sua mortalidade.
Gabriel García Márquez: Em "Cem
Anos de Solidão" e outras obras, Márquez retrata a passagem do tempo e o
envelhecimento de personagens e famílias ao longo de gerações, explorando a
memória, a tradição e o legado da velhice.
Philip Roth: Em seus romances tardios, como "Patrimônio" e "Everyman", Roth explora de forma íntima e por vezes dolorosa as questões da mortalidade, da doença e da perda de autonomia associadas ao envelhecimento.
Cormac McCarthy: Em obras como "A Estrada", McCarthy retrata um mundo pós-apocalíptico onde um pai e um filho lutam para sobreviver, e a figura paterna, embora não necessariamente velha no início, carrega o peso do tempo e da experiência em um mundo implacável.
Margaret Atwood: Em "The
Testaments", sequência de "O Conto da Aia", Atwood apresenta
narrativas de personagens mais velhas que viveram sob um regime totalitário,
oferecendo perspectivas valiosas sobre resistência, memória e o impacto do
tempo.
© Alberto Araújo
Niterói, janeiro de 2020
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