segunda-feira, 14 de abril de 2025

O BORDADO DO TEMPO MINICONTO DE ALBERTO ARAÚJO



O vento que varre a tarde, aqui na janela do meu apartamento, traz consigo não só o cheiro salgado do mar quebrando na restinga, mas também um murmúrio, uma cantiga quase esquecida. É a voz do tempo, tecendo fios invisíveis na trama dos dias, um bordado sutil que enfeita a alma sem que a gente perceba de imediato. 

Olho para as ondas que se esparramam na areia, cada uma com sua efêmera beleza, sua espuma branca rendilhada que logo se desfaz. É como a alegria que nos visita, um instante luminoso que se retira, deixando na memória a suave lembrança de sua passagem. E a tristeza? Ah, a tristeza é como a maré baixa, revelando as pedras ásperas, os recifes escondidos, as dores que habitam o fundo do nosso ser. Mas mesmo essa aridez tem sua melancólica poesia, sua força silenciosa que nos ensina a resistir. 

As gaivotas circulam no céu límpido, seus gritos ecoando como notas musicais dispersas. Elas sabem o segredo do vento, a liberdade de planar sobre o vasto azul, sem amarras, sem perguntas. Quem me dera ter a leveza de suas asas, a despreocupação de seu voo! Mas nós, seres presos à terra, carregamos em nossos ombros o peso das escolhas, a saudade dos caminhos não trilhados, a sombra incerta do amanhã. 

Vejo as crianças brincando na praia, construindo castelos de areia que a próxima onda inevitavelmente destruirá. Em sua despreocupação reside uma profunda sabedoria: a beleza do instante presente, a alegria do construir mesmo sabendo da transitoriedade. Nós, adultos, por vezes esquecemos essa lição essencial, presos à ânsia de permanência, ao medo da perda. 

A luz do sol declina, pintando o céu com tons de laranja, rosa e violeta. É o instante mágico da transição, o dia se despedindo em cores vibrantes antes de se entregar ao mistério da noite. Assim também a vida, feita de encontros e despedidas, de começos e fins, cada etapa com sua beleza singular, sua melancolia inerente. 

E enquanto a noite se instala, trazendo consigo o brilho distante das estrelas, sinto que o bordado do tempo continua sua obra silenciosa. Cada experiência, cada sorriso, cada lágrima é um ponto delicado nessa tapeçaria invisível que nos veste a alma. Um bordado que não se pode desfazer, mas que se enriquece a cada novo dia, a cada nova vivência, guardando em seus fios a melodia sutil da nossa própria história. E nessa melodia, mesmo na mais tênue nota de tristeza, reside a beleza profunda de sermos quem somos, passageiros únicos neste imenso e eterno tear do tempo. 

© Alberto Araújo

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