Vem
sem receio: eu te recebo
Como
um dom dos deuses do deserto
Que
decretaram minha trégua, e permitiram
Que
o mel de teus olhos me invadisse.
Quero
que o meu amor te faça livre,
Que
meus dedos não te prendam
Mas
contornem teu raro perfil
Como
lábios tocam um anel sagrado.
Quero
que o meu amor te seja enfeite
E
conforto, porto de partida para a fundação
Do
teu reino, em que a sombra
Seja
abrigo e ilha.
Quero
que o meu amor te seja leve
Como
se dançasse numa praia uma menina.
O poema “Canção do Amor Sereno” de Lya Luft apresenta uma visão delicada e profunda do amor, distante de paixões avassaladoras e possessivas. Através de uma linguagem lírica e imagética, a poeta constrói uma atmosfera de tranquilidade e entrega, onde o amor se manifesta como um presente divino e uma força libertadora.
O poema é composto por quatro estrofes de quatro versos cada, predominantemente decassílabos, conferindo um ritmo suave e cadenciado à leitura, que remete à serenidade expressa no título. A repetição da estrutura frasal iniciada por "Quero que o meu amor te..." nas três últimas estrofes enfatiza o desejo e a intenção da voz lírica em relação ao ser amado, construindo uma progressão de oferendas e votos.
A linguagem utilizada é rica em metáforas e comparações que evocam sensações de leveza, liberdade e segurança. A chegada do amado é comparada a um "dom dos deuses do deserto", sugerindo raridade e providência, um alívio em meio à aridez da solidão. A imagem do "mel de teus olhos" que invade a voz lírica transmite uma sensação de doçura e profundidade do impacto desse encontro.
O tema central do poema reside na concepção de um amor que não aprisiona, mas liberta. A voz lírica expressa o desejo de que seus dedos "não te prendam / Mas contornem teu raro perfil", utilizando o toque como uma forma de apreciação e respeito pela individualidade do outro. A comparação com o toque em "um anel sagrado" eleva esse gesto a um nível de reverência e valorização.
O amor é apresentado como algo que embeleza ("enfeite") e oferece segurança ("conforto, porto de partida"). A metáfora do "porto de partida para a fundação / Do teu reino" sugere que o amor serve como base e impulso para o crescimento e a autonomia do ser amado, um lugar onde a "sombra / Seja abrigo e ilha", representando proteção e individualidade.
A imagem da "menina" que dança "numa praia" evoca a leveza, a espontaneidade e a pureza do amor desejado. Essa comparação reforça a ideia de um sentimento desimpedido, livre de fardos e obrigações.
A frase inicial "Vem sem / receio: eu te recebo" estabelece um tom de acolhimento e convite à confiança. O amor oferecido não impõe condições, mas se apresenta como um refúgio seguro.
A "Canção do Amor Sereno" é uma ode a um amor maduro e consciente, que prioriza a liberdade e o bem-estar do outro. Longe de idealizações românticas tradicionais, o poema celebra um sentimento que se manifesta na delicadeza dos gestos, na beleza da admiração e na segurança do apoio. É um amor que se doa sem expectativas de posse, que se oferece como um presente precioso capaz de transformar a vida do ser amado, tornando-a mais leve, bela e segura.
A "Canção do Amor Sereno" de Lya Luft ecoa como um sussurro de rio em leito de pedras, cada verso esculpindo a imagem de um amor que transcende o efêmero. A poeta nos convida a um mergulho nas profundezas de um sentimento que não aprisiona, mas liberta, que não sufoca, mas embeleza.
A leveza do amor se revela na dança de uma menina na praia, um movimento puro e desimpedido, assim como o amor que Lya Luft deseja oferecer. Um amor que não impõe limites, mas que serve de porto seguro, um farol a guiar a alma em sua jornada.
Em cada palavra, a poeta tece um manto de serenidade, onde o amor se torna refúgio e impulso, sombra e ilha, um reino particular onde a alma encontra paz e liberdade. É um amor que se doa sem reservas, que se oferece como um presente divino, um oásis no deserto da solidão.
A "Canção do Amor Sereno" é um convite à entrega, à confiança, à permissão de ser amado sem amarras. É um amor que se manifesta na simplicidade de um toque, no contorno de um perfil, na beleza de um enfeite, na segurança de um porto. É um amor que se revela na leveza de uma dança, na liberdade de um voo, na serenidade de um rio.
Em
suma, o poema de Lya Luft é uma reflexão sensível sobre a natureza do amor em
sua forma mais pura e libertadora, um convite a vivenciar relacionamentos
baseados no respeito, na admiração e na entrega serena.
© Alberto Araújo
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