quinta-feira, 23 de outubro de 2025

A ETERNIDADE DA ILÍADA E A VOZ DO PROFESSOR MARCO ANTÔNIO MARTINS PEREIRA - ENSAIO DE ALBERTO ARAÚJO

Este ensaio foi inspirado em uma postagem recente do professor Marco Antônio Martins Pereira em sua página no Facebook, na qual ele compartilhou reflexões sobre a Ilíada e sua importância na tradição literária. A partir desse gesto, que ecoa o canto dos antigos aedos, nasceu o presente texto, que busca unir lirismo e reflexão cultural. 

Há obras que não pertencem apenas ao tempo em que nasceram, mas atravessam os séculos como se fossem rios subterrâneos, alimentando a imaginação, a cultura e a própria identidade da humanidade. Entre elas, a Ilíada ocupa um lugar singular: poema épico que, mesmo composto há quase três milênios, continua a pulsar como se fosse um coração vivo, lembrando-nos da fragilidade e da grandeza humanas. 

O professor Marco Antônio Martins Pereira, especialista em Homero e leitor atento da tradição clássica, tem se dedicado a iluminar esse patrimônio literário com a clareza de quem não apenas estuda, mas também vive a poesia. Sua docência é um ato de mediação entre mundos: o da Grécia arcaica, com seus aedos que recitavam versos ao som da lira, e o nosso, marcado pela pressa e pela fragmentação, mas ainda sedento de sentido. 

A Ilíada concentra-se em um recorte preciso: o décimo ano da Guerra de Troia. Não é a totalidade do conflito que interessa, mas a intensidade de um sentimento, a ira de Aquiles. Essa cólera, nascida de uma disputa com Agamêmnon, comandante dos exércitos gregos, desencadeia uma cadeia de eventos que culmina na morte de Heitor, o maior herói troiano, e no seu funeral. 

O que poderia parecer apenas um episódio bélico transforma-se, pela força da poesia, em reflexão sobre a condição humana. A ira de Aquiles não é apenas pessoal: é metáfora da tensão entre honra e destino, entre orgulho e mortalidade. O professor Marco Antônio, ao comentar essa dimensão, mostra como Homero, ou melhor, os aedos que transmitiram oralmente o poema, souberam transformar a violência em arte, a dor em canto, a morte em memória. 

Composta por 15.693 versos em hexâmetro datílico, a Ilíada é dividida em 24 cantos. Essa estrutura não é mero artifício técnico: é a moldura que sustenta a monumentalidade da narrativa. O hexâmetro, ritmo tradicional da poesia épica grega, confere musicalidade e solenidade, permitindo que o poema fosse recitado e memorizado.

Mais fascinante ainda é a língua em que foi composta: uma mistura de dialetos, uma língua literária artificial, nunca falada de fato na Grécia. É como se os aedos tivessem criado um idioma próprio para a eternidade, um idioma que não pertence a nenhuma pólis, mas a toda a humanidade. 

O professor Marco Antônio destaca esse aspecto como um dos grandes legados da tradição épica: a consciência de que a literatura pode inventar não apenas mundos, mas também linguagens. Ao ensinar isso, ele convida seus alunos a perceberem que a palavra é sempre criação, e que a literatura é um espaço de liberdade radical.

Atribuímos a Ilíada a Homero, mas a verdade é mais complexa. Foram os aedos, poetas itinerantes, guardiões da memória oral, que deram forma ao poema, recitando-o ao som da lira. Homero, se existiu, é menos um indivíduo e mais um símbolo: a personificação de uma tradição coletiva. 

Essa reflexão sobre a autoria é preciosa em tempos em que valorizamos tanto a assinatura individual. O professor Marco Antônio, ao trazer esse debate, mostra que a literatura nasce também do anonimato, da voz coletiva, da transmissão de geração em geração. A Ilíada não é apenas obra de um gênio isolado, mas de uma comunidade que soube transformar experiência em canto. 

Falar da Ilíada é falar de guerra, mas também de humanidade. É falar de morte, mas também de memória. É falar de ira, mas também de compaixão. O professor Marco Antônio Martins Pereira, ao se dedicar a essa obra, cumpre uma função essencial: a de manter viva a chama da tradição clássica em um mundo que tantas vezes esquece suas raízes. 

Sua docência não é apenas transmissão de conhecimento, mas ato de resistência cultural. Ao comentar Homero, ao dialogar com a obra de Nélida Piñon, ao escrever críticas literárias, ele mostra que a literatura é um tecido contínuo, em que o passado e o presente se entrelaçam. 

Assim como os aedos recitavam ao som da lira, o professor recita com sua voz crítica e pedagógica, despertando em seus alunos a consciência de que a literatura não é um luxo, mas uma necessidade vital. 

Por que ainda lemos a Ilíada? Porque ela nos lembra de que a condição humana é feita de conflitos, mas também de beleza. Porque ela nos mostra que a ira pode ser transformada em poesia, e que a morte pode ser narrada de modo a dignificar a vida. 

Em um mundo marcado por guerras, desigualdades e crises, a Ilíada continua a nos interpelar. E professores como Marco Antônio Martins Pereira são os mediadores que nos ajudam a ouvir essa voz antiga, mas sempre atual. 

A Ilíada termina com o funeral de Heitor, mas o canto não termina. Ele atravessa os séculos, ecoando em cada leitor, em cada sala de aula, em cada crítica literária. O professor Marco Antônio, ao se dedicar a essa obra, inscreve-se nessa tradição de guardiões da memória. 

Se os aedos tinham a lira, ele tem a palavra crítica e a docência. Se Homero foi o nome dado a uma coletividade, Marco Antônio é o nome de um mestre que, em nosso tempo, mantém viva a chama da poesia épica. 

A Ilíada é mais do que um poema: é um espelho em que a humanidade se reconhece. E a docência é mais do que um ofício: é um ato de amor ao conhecimento, um gesto de confiança no futuro. 

Assim, ao celebrarmos a obra de Homero e a dedicação do professor Marco Antônio Martins Pereira, celebramos também a própria literatura, essa arte que, como a ira de Aquiles, pode ser devastadora, mas que, como o canto dos aedos, é capaz de atravessar a morte e tocar a eternidade. 

Este ensaio foi escrito após a leitura de uma postagem do professor Marco Antônio Martins Pereira em sua página no Facebook, cuja erudição e sensibilidade motivaram estas reflexões.

© Alberto Araújo 


 






Nenhum comentário:

Postar um comentário