Chegar aos 80 anos é como atravessar uma ponte suspensa sobre o tempo, uma travessia que poucos têm o privilégio de completar. Não é o fim da estrada, como muitos pensam, mas o início de uma nova paisagem, onde o horizonte se abre com outras cores, outras texturas, outros ritmos. É uma fase em que o tempo deixa de ser urgência e passa a ser presença. Cada dia ganha o valor de uma joia rara, e cada manhã é uma nova chance de respirar fundo e agradecer.
O corpo, é verdade, já não responde com a mesma pressa da juventude. Os passos são mais lentos, os gestos mais contidos, e o vigor talvez tenha se recolhido para dar lugar à delicadeza. Mas ainda há graça no movimento. Caminhar, dançar, alongar os braços ao sol, tudo isso é mais do que exercício físico: é um gesto de afirmação. É como dizer ao mundo, com o corpo inteiro, que ainda há vida pulsando aqui. Que o coração ainda bate com vontade, que os músculos ainda sabem o caminho da alegria, mesmo que em outro compasso.
A alegria, aliás, muda de lugar. Ela já não se esconde nas grandes conquistas, nas festas barulhentas ou nas vitórias públicas. Ela se revela nos detalhes, e talvez sempre tenha estado ali, só que agora temos olhos mais atentos para vê-la. Um café quente pela manhã, o cheiro do pão saindo do forno, o canto de um sabiá na janela, o toque de uma mão amiga, o riso de um neto, o silêncio confortável de uma tarde sem pressa. A felicidade, depois dos 80, não está em conquistar, mas em perceber. Em saborear o instante com a calma de quem já entendeu que tudo passa e que, por isso mesmo, tudo importa.
Aceitar as mudanças do corpo não é se render, é se respeitar. Cada ruga é uma linha escrita pela vida. Cada dorzinha é um lembrete de que se viveu intensamente. Cada pausa é uma oportunidade de escuta, de contemplação, de reencontro consigo mesmo. O corpo fala, e aprender a ouvi-lo é um gesto de sabedoria. Não se trata de nostalgia, mas de reverência. O passado não é um peso, é um alicerce. E o presente, esse sim, é o palco onde a vida continua a acontecer.
A mente, por sua vez, é um jardim que floresce com estímulo. Ler um bom livro, ouvir uma música nova, aprender uma receita, conversar sobre o que se viu no noticiário ou sobre as lembranças da infância, tudo isso mantém as ideias frescas e o espírito desperto. A curiosidade é uma chama que não se apaga com o tempo; ela apenas muda de intensidade. Às vezes, é um incêndio de entusiasmo; outras, uma brasa discreta, mas constante. E manter essa chama acesa é um dos segredos da longevidade com qualidade. Porque quem se interessa pela vida, vive mais, e melhor.
Conversar, nessa fase, é mais do que trocar palavras. É manter o coração em movimento. Os vínculos afetivos são como raízes que sustentam a árvore da vida. Mesmo que os amigos estejam longe, mesmo que alguns já tenham partido, cultivar os laços que restam é essencial. Uma ligação inesperada, uma carta escrita à mão, uma visita breve, tudo isso tem o poder de iluminar os dias. A solidão pode ser silenciosa, mas o afeto é barulhento, e precisa ser ouvido, celebrado, mantido vivo.
Adaptar-se é uma virtude que cresce com os anos. Saber lidar com limitações, com perdas, com mudanças, tudo isso exige coragem. Mas também oferece liberdade. Quando se aprende a viver com o que se tem, descobre-se que o essencial sempre esteve por perto. A vida, afinal, não é feita do que falta, mas do que floresce apesar das ausências. E rir de si mesmo é talvez o maior sinal de saúde emocional. A leveza não é superficial, é profunda. É o que permite seguir em frente sem carregar o peso do que já passou. É o que transforma o cotidiano em poesia.
Depois dos 80, o tempo ganha outro sabor. Já não se corre atrás dos ponteiros, caminha-se ao lado deles. Cada dia é uma oportunidade de reencontro com o que realmente importa. A pressa cede lugar à presença. O ruído dá espaço ao silêncio fértil. E o agora se torna o melhor lugar para estar.
Viver bem depois dos 80 é, acima de tudo, celebrar o agora. Não é preciso esperar grandes conquistas. O simples fato de estar aqui, respirando, sentindo, lembrando, já é motivo suficiente para agradecer. O tempo pode ter passado, mas a vida continua, e ela ainda tem muito a oferecer. Há beleza na lentidão, há sabedoria na escuta, há poesia no cotidiano. E há, sobretudo, uma alegria serena que só o tempo é capaz de ensinar.
Porque viver, no fim das contas, é
isso: um exercício diário de encantamento. E depois dos 80, esse encantamento
se torna ainda mais precioso. É como se a vida dissesse: “Você chegou até aqui.
Agora, dance no seu ritmo, sorria com seus olhos, abrace com sua história. E
continue, com leveza, com sabedoria, com movimento.”
@ Alberto Araújo
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