sábado, 28 de junho de 2025

O DIA EM QUE DEUS CAMINHOU DESCALÇO CRÔNICA POÉTICA E CONTEMPLATIVA POR ALBERTO ARAÚJO

Era um daqueles dias que a alma reconhece antes mesmo dos olhos abrirem. O céu estava azul com um quê de eternidade, e o sol, em vez de queimar, afagava. Não era feriado, tampouco data marcante no calendário dos homens, mas para quem sente a vida por dentro, era um marco silencioso: o dia em que Deus decidiu caminhar descalço sobre a Terra.

 

Saí sem pressa, com os pés nus, como quem devolve à terra o respeito esquecido. A grama úmida me recebeu como um velho amigo, um daqueles que nunca cobrou nada além da presença. Os beija-flores brincavam de poesia com as flores. Não havia plateia, nem aplausos, mas havia encanto, e era suficiente.

 

Vi uma árvore imensa, como um ancião sereno. Abracei-a. Não sei se foi ela que me sustentou ou eu que a agradeci por ainda estar ali, firme, ofertando sombra a quem soubesse parar. E foi nesse abraço de tronco e pele que ouvi um sussurro antigo: “Tudo o que você precisa, você já tem.”

 

Mais adiante, as montanhas emolduravam o silêncio. Elas não pedem nada, só estão. São testemunhas do tempo, do amor, das guerras, da paz. São a oração dos que não sabem rezar com palavras.

 

Os passarinhos cantavam sem pauta, numa sinfonia livre, como se anunciassem que o simples ainda salva. E ali, entre o céu e o chão, eu entendi: viver é isso. Respirar fundo, agradecer, não correr tanto. Ver Deus nas coisas pequenas. Ou melhor, nas coisas grandes disfarçadas de pequenas.

 

Naquele dia lindo, não fiz nada grandioso. Mas senti tudo. E talvez, só talvez, isso seja o mais próximo que a gente chegue do sagrado.

 

Porque quando a gente anda descalço, o coração pisa mais leve.

E quando se abraça uma árvore, é a gente que floresce.

 

© Alberto Araújo

 


 

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