domingo, 29 de junho de 2025

O MENINO AINDA MORA EM MIM - POEMA DE ALBERTO ARAÚJO


O MENINO AINDA MORA EM MIM
(poema para quem nunca desfez as malas da infância)

Poema de Alberto Araújo

 

O menino ainda mora em mim.
Aquele que corria no barro quente
com os joelhos ralados de céu,
e o coração lambuzado de esperança.
 

Ele aparece quando o vento me chama pelo nome
que só minha mãe sabia dizer
com aquele carinho que bendizia os dias.

Ainda ouço os sinos da Igreja de Santa Luzia
tocando dentro do peito,
como se fosse ontem a procissão,
os fogos, a fé vestida de branco
e a cidade inteira ajoelhada de ternura.

 

O menino sorri quando eu me esqueço do tempo,
e olha com olhos grandes
as ondas de Icaraí me explicando
que tudo vai e volta — menos o que é eternidade.

Ele me segura pela alma,
quando o mundo pesa demais,
e diz, em silêncio:
“Lembra da rede na varanda?
Do cheiro de laranja descascada?
Do riso dos teus irmãos na chuva?”

O homem que sou aprendeu a escutar.
Aprendeu que viver é ser ponte,
é ser cais e correnteza,
é amar como quem planta
estrelas nos olhos de quem passa.

 

Hoje, sou travessia.
Sou abraço do que fui com o que sou.
E no fundo dos meus olhos,
se você olhar com calma,
vai ver o menino ali — brincando com o tempo,
sem medo de ser eterno.

 

© Alberto Araújo

 


 

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