LUAR DO SERTÃO CATULO DA PAIXÃO CEARENSE, JOÃO PERNAMBUCO QUANDO MARLENE DIETRICH ESTEVE NO BRASIL EM 1959, ELA CANTOU ESTA FAMOSA CANÇÃO DO CANCIONEIRO BRASILEIRO, LUAR DO SERTÃO.
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Luar do Sertão Catulo da Paixão
Cearense, João Pernambuco por Editores da Enciclopédia Itaú Cultura
Uma das mais conhecidas músicas do
cancioneiro brasileiro, Luar do Sertão tem sua primeira gravação por Eduardo
das Neves (1874-1919), em disco da Odeon lançado em 1914, catalogado como toada
sertaneja. Na esteira da música chamada “caipira” ou “sertaneja” – fusão de
ritmos e gêneros do interior do país, tais como modas, toadas, cateretês...
Uma das mais conhecidas músicas do
cancioneiro brasileiro, Luar do Sertão tem sua primeira gravação por Eduardo
das Neves (1874-1919), em disco da Odeon lançado em 1914, catalogado como toada
sertaneja. Na esteira da música chamada “caipira” ou “sertaneja” – fusão de
ritmos e gêneros do interior do país, tais como modas, toadas, cateretês e
emboladas – esta gravação se encerra com um diálogo entre o intérprete e uma
das coristas, remetendo aos laços comunitários do homem rural. Com versos
singelos, intercalados pelo estribilho:
Não há, oh gente
Oh não,
Luar como esse
Do Sertão.
A canção traz referências à natureza e
à simplicidade da vida no campo. Evoca a lua, a serra, a mata, a viola, o canto
da sururina, o galo triste, a onça contemplando o luar sem pressa, em
contraponto à “gente fria” e ao “luar escuro” da cidade. A simplicidade é um
dos fatores responsáveis por sua perpetuação na memória afetivo-musical de
várias gerações.
Os versos são inspirados no coco É do
Maitá ou Meu Engenho é de Humaitá, adaptado e apresentado a Catulo da Paixão
Cearense (1863-1946) pelo violonista João Pernambuco (1883-1947), que leva
alguns anos para reivindicar a coautoria. O motivo provável é o fato de se
considerar um adaptador, não compositor. O radialista e pesquisador Almirante
(1908-1980) que, a partir de 1939 torna Luar do Sertão prefixo musical da Rádio
Nacional, reacende a polêmica em seus programas nos anos 1950. Mais tarde, em
seu livro No Tempo de Noel Rosa (1963), reitera a versão de que Catulo teria se
apropriado da melodia de Pernambuco para compor seus versos, amparando-se em
depoimentos de Heitor Villa-Lobos (1887-1959), Mozart de Araújo (1904-1988), Sílvio
Salema (1901-1976) e Benjamin de Oliveira (1870-1954). Na mesma direção, Ary
Vasconcelos (1926-2003) relata, em seu Panorama da Música Popular Brasileira na
Belle Époque (1977), ter ouvido Luperce Miranda (1904-1977) tocar duas versões
do É do Maitá: a original e outra de João Pernambuco, esta muito parecida com
Luar do Sertão.
Quando a toada é lançada, Catulo já é
reconhecido como poeta e mediador cultural. Consegue levar o violão,
instrumento rechaçado pela elite, ao prestigiado recital no Instituto Nacional
de Música (1908). João Pernambuco também conquista espaço, e lança moda no Rio
de Janeiro, com a caracterização sertaneja do seu Grupo Caxangá, que encerra o
ciclo de conferências Lendas e Tradições Brasileiras. O ciclo foi promovido
pelo escritor Afonso Arinos (1868-1916) no Theatro Municipal de São Paulo no
ano seguinte à gravação. A tendência regionalista ganha fôlego: toadas, canções
sertanejas e outros gêneros regionais passam a conviver com valsas, mazurcas e
cançonetas francesas nos salões da capital. Tais gêneros perdem a preferência
para o samba no final dos anos 1920.
Dedicado a Assis Chateaubriand
(1982-1968), o poema, com suas 12 estrofes, é publicado por Catulo em seu livro
Mata Iluminada (1924). Antes disso, a canção já é cantada nas rodas de serestas
em versão reduzida, fixada pelo padrão dos registros fonográficos, com faixas
em torno de três minutos de duração. Ela se estrutura em uma única frase. A
segunda parte é uma variação estrita da primeira, permitindo ao refrão soar ao
fundo, cantado ou tocado, simultaneamente à estrofe, que traz as novas letras.
A dos anos 1930, todas as gravações restringem-se a três estrofes, que variaram
conforme o intérprete, assim como o gênero indicado no selo do disco. Isto
aponta a fluidez dos gêneros na indústria fonográfica brasileira, e o
estabelecimento de padrões de instrumentação na música gravada, nos quais os
grupos de choro e seresta têm papel fundamental.
Além de toada, Luar do Sertão é
chamado de canção, nas gravações de Paraguassu (1890-1976), em 1936; de
Francisco Alves (1898-1952), em 1943; na versão de Singing Babies, em 1935; de
Vicente Celestino (1894-4968), em 1952 e Paulo Tapajós (1913-1990), em 1955.
Nota-se o contraste entre as gravações de Eduardo das Neves e Paraguassu, nas
quais o coro e a instrumentação são mais contidos, com o tratamento orquestral
grandiloquente; a versão de Vicente Celestino tem seu característico dó de
peito, e a de Francisco Alves, orquestração em ritmo jocoso.
A partir do sucesso de Luar do Sertão,
Catulo muda os rumos de seu trabalho, passando de conhecido autor de modinhas a
poeta sertanejo. A poesia de Luar do Sertão, ainda fiel às regras gramaticais e
aos cânones românticos, é a porta de entrada para trabalhos que ora levam o
poeta a ser criticado, ora elogiado. A crítica vem de autores como Monteiro
Lobato (1882-1948), avesso às deturpações da norma culta em função do dialeto
caipira. O elogio vem, por exemplo, de Mário de Andrade que reconhece na
imitação da dicção e do sentir do homem rural o aspecto mais admirável de sua
poesia. Em entrevista para Joel Silveira (1918-2007) e Francisco de Assis
Barbosa (1914-1991), Catulo declara ter escrito mais de 200 modinhas, criado um
novo estilo, “mas, com o império dos sambas e das marchinhas, tudo isso já
morreu! De todo esse florilégio lírico só não morrerá o Luar do Sertão.2
A percepção do poeta parece acertada:
Luar do Sertão é uma das canções mais regravadas na história da música popular
brasileira de todas as gerações. Recebe versões de Orlando Silva (1915-1978),
Luiz Gonzaga (1912-1989), Inezita Barroso (1925-2015), Maria Bethânia (1946),
Elba Ramalho (1951), Elomar (1937), Xangai (1948), Chitãozinho e Xororó, Baden
Powell (1937-2000), Caetano Veloso (1942), Jair Rodrigues (1939-2014), Milton
Nascimento (1942), Roberto Côrrea (1957), Eliete Negreiros (1951). No funeral
de Catulo, ela é entoada por milhares de pessoas.
Notas
1. ANDRADE, Mário de. Aspectos da
música brasileira. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes; Brasília: INL, 1975. p.
126.
2. Segunda edição publicada em 1945,
citada por VASCONCELOS, Ary. Panorama da Música Popular Brasileira na Belle
Époque. Rio de Janeiro: Livraria Sant’Anna, 1977. p. 121.
Fontes de pesquisa 8Abrir módulo
ANDRADE, Mário de. Aspectos da música
brasileira. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes; Brasília: INL, 1975. 247 p.
CEARENSE, Catullo da Paixão. Matta
Iluminada. Rio de Janeiro: Livraria Castilho, 1924.
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Disponível em:< http://dx.doi.org/10.1590/S0103-40142004000300024 >.
Acesso em: 21 out. 2015.
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Cearense ou a trajetória literária de um bardo ordinário. XXVII Simpósio
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http://snh2013.anpuh.org/resources/anais/27/1371332449_ARQUIVO_Catullosertanejo-artigo_1_.pdf
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http://www.sonora.iar.unicamp.br/index.php/sonora1/article/viewFile/20/19 >.
Acesso em: 21 out. 2013.
SEVERIANO, Jairo e MELLO, Zuza Homem
de. A canção no tempo: 85 anos de músicas brasileiras (vol. 1: 1901-1957). São
Paulo: Editora 34, 1997. (Coleção Ouvido Musical).
VASCONCELOS, Ary. Panorama da Música
Popular Brasileira na Belle Époque. Rio de Janeiro: Livraria Sant'Anna, 1977.
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ZAN, José Roberto. Tradição e
assimilação na música sertaneja. Anais do 9º Congresso Internacional da
Brazilian Studies Association (Brasa). Nova Orleans, Louisiana, Tulane
University, 2008. Disponível em: < http://www.brasa.org/wordpress/Documents/BRASA_IX/Jose-Roberto-Zan.pdf
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Para citar a Enciclopédia Itaú
Cultural como fonte de sua pesquisa
LUAR do Sertão. In: ENCICLOPÉDIA Itaú
Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2021.
Disponível em: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra6120/luar-do-sertao.
Acesso em: 06 de dezembro de 2021.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7
Última atualização: 12.09.2019
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