quarta-feira, 23 de abril de 2025

O ACHADO LUMINOSO NO CONVENTO DAS CARMELITAS DA VÁRZEA DAS LETRAS CONTO DE ALBERTO ARAÚJO


Na penumbra acolhedora do Convento das Carmelitas da Várzea das Letras, entre estantes poeirentas que guardavam o eco de séculos de saber, a bibliotecária Sofia dedicava-se à sua rotina com a paixão silenciosa dos amantes dos livros. Seus dedos deslizavam pelas lombadas, reconhecendo cada título como um velho amigo. Naquela manhã de abril, enquanto reorganizava uma seção de obras antigas, seus olhos pousaram em um volume de encadernação singela, quase esquecido entre edições mais recentes. Algo naquele livro emanava uma aura diferente, um sussurro do passado que a chamava. 

Com cuidado reverente, Sofia retirou o exemplar. A capa de couro desbotada ostentava discretas letras douradas que formavam o título inconfundível: Os Lusíadas. O coração de Sofia acelerou. Ao abrir a primeira página amarelada pelo tempo, deparou-se com a impressão delicada de tipos antigos e a marca d'água de um impressor quinhentista. Uma onda de excitação percorreu seu corpo. Seria possível? Estaria em suas mãos um exemplar original da obra-prima de Luís Vaz de Camões? 

A notícia do achado extraordinário se espalhou como um rastilho de pólvora pela comunidade acadêmica e artística luso-brasileira da região. A data de 23 de abril, Dia Mundial do Livro, ganhou um significado ainda mais especial no Convento das Carmelitas da Várzea das Letras. A biblioteca do convento se tornou palco de um evento memorável, uma homenagem vibrante à epopeia que cantou os feitos marítimos portugueses e a alma lusitana. 

Inúmeros acadêmicos, críticos literários, poetas e artistas cruzaram os portões seculares do convento. Havia no ar uma atmosfera de solenidade e encantamento. Discursos eloquentes exaltaram a genialidade de Camões, a beleza da língua portuguesa e a importância de Os Lusíadas para a identidade cultural luso-brasileira. Versos imortais foram declamados com emoção, melodias antigas ecoaram pelos salões e exposições de arte inspiradas na obra adornavam o espaço. 

Naquele dia, Sofia, a bibliotecária discreta do Convento das Carmelitas da Várzea das Letras, sentiu-se parte de algo grandioso. O livro perdido, agora reencontrado, unia gerações e celebrava a perenidade da literatura naquele recanto dedicado ao saber. Aquele exemplar original de Os Lusíadas, testemunha silenciosa de séculos de história, brilhava como um farol, iluminando o passado e inspirando o futuro da cultura luso-brasileira naquele pedaço especial da Várzea das Letras. A homenagem no Dia do Livro transcendeu a celebração de uma obra; tornou-se um tributo à força da palavra, à magia dos livros e à dedicação daqueles que os guardam e os revelam ao mundo no Convento das Carmelitas. 

© Alberto Araújo

23 de abril de 2025 


Capa da primeira edição d'Os Lusíadas, de 1572


SOBRE OS LUSÍADAS DE LUÍS VAZ DE CAMÕES

"Os Lusíadas", de Luís Vaz de Camões, é a obra original que celebra a história das grandes navegações portuguesas, particularmente a viagem de Vasco da Gama à Índia. Publicada pela primeira vez em 1572, é considerada a maior obra da literatura portuguesa e um marco da língua. Provavelmente iniciada em 1556 e concluída em 1571, foi publicada em Lisboa em 12 de março de 1572, no período literário do Classicismo, ou Renascimento tardio, três anos após o regresso do autor do Oriente, via Moçambique. 

HISTÓRIA 

Os Lusíadas é uma obra de poesia épica do escritor português Luís Vaz de Camões, a primeira epopeia portuguesa publicada em versão impressa. A obra é composta por dez cantos, 1.102 estrofes e 8 816 versos em oitavas decassilábicas, sujeitas ao esquema rímico fixo AB AB AB CC – oitava rima real, ou camoniana. A ação central é a descoberta do caminho marítimo para a Índia por Vasco da Gama, à volta da qual se vão evocando outros episódios da história de Portugal, glorificado o povo português. Considerada a obra mais importante da literatura de língua portuguesa, é frequentemente comparada à Eneida de Virgílio (séc. I a.C.). 

Escrito à moda homérica, Os Lusíadas é muitas vezes considerado como o épico nacional de Portugal, tanto quanto a Eneida de Virgílio foi para os antigos romanos, ou a Ilíada e a Odisseia de Homero para os antigos gregos. 

O poema evoca o período que precede a retomada de Valência em 1102 pelos Almorávidas, bem como aquele dos Almohadas, cuja capital é Marraquexe, e o período que precede a batalha dos Três Reis.

Estrutura 

“As armas e os barões assinalados A

Que, da ocidental praia lusitana, B

Por mares nunca de antes navegados A

Passaram ainda além da Taprobana, B

Em perigos e guerras esforçados, A

Mais do que prometia a força humana, B

E entre gente remota edificaram C

Novo reino, que tanto sublimaram. C”

— Os Lusíadas, Canto I, estrofe 1 

A estrutura externa refere-se à análise formal do poema: número de estrofes, número de versos por estrofe, número de sílabas métricas, tipos de rimas, ritmo, figuras de estilo, etc. Assim: Os Lusíadas é constituído por dez partes, chamadas de cantos na lírica; cada canto tem um número variável de estrofes (em média, 110); as estâncias são oitavas, tendo portanto oito versos; a rima é cruzada nos seis primeiros versos e emparelhada nos dois últimos (AB AB AB CC, ver na citação ao lado); cada verso é constituído por dez sílabas métricas (decassilábico), na sua maioria heróicas (acentuadas nas sextas e décimas sílabas). Sendo Os Lusíadas um texto renascentista, não poderia deixar de seguir a estética grega que dava particular importância ao número de ouro. Assim, o clímax da narrativa, a chegada à Índia, foi colocada no ponto que divide a obra na proporção áurea (início do Canto VII). 

A estrutura interna relaciona-se com o conteúdo do texto. Esta obra mostra ser uma epopeia clássica ao dividir-se em quatro partes:

Proposição - introdução, apresentação do assunto e dos heróis (estrofes 1 a 3 do Canto I); 

Invocação - o poeta invoca as ninfas do Tejo e pede-lhes a inspiração para escrever (estrofes 4 e 5 do Canto I); 

Dedicatória - o poeta dedica a obra ao rei D. Sebastião (estrofes 6 a 18 do Canto I); 

Narração - a narrativa da viagem, in medias res, partindo do meio da ação para voltar atrás no tempo e explicar o que aconteceu até ao momento na viagem de Vasco de Gama e na história de Portugal, e depois prosseguir na linha temporal. 

Por fim, há um epílogo a concluir a obra (estrofes 145 a 156 do Canto X).

Os planos temáticos da obra são:

Plano da Viagem - onde se trata da viagem da descoberta do caminho marítimo para a Índia de Vasco da Gama e dos seus marinheiros; 

Plano da História de Portugal - são relatados episódios da história dos portugueses; 

Plano da Mitologia - são descritas as influências e as intervenções dos deuses da mitologia greco-romana na ação dos heróis. 

Plano das considerações do Poeta - Camões refere-se a si mesmo enquanto poeta admirador do povo e dos heróis portugueses; 

Ao longo da narração deparam-se-nos vários tipos de episódios: bélicos, mitológicos, históricos, simbólicos, líricos e naturalistas. 

IMPRESSÃO 

Da edição impressa pela primeira vez em 1572 em Lisboa, ou de outras apresentadas com a mesma data, mas que podem ter sido impressas nos anos seguintes ainda ao abrigo da mesma licença, subsistem apenas 34 exemplares conservados em três Continentes. 

INSTITUIÇÕES COM A OBRA ORIGINAL 

Academia Brasileira de Letras

Academia das Ciências de Lisboa

Ateneu Comercial do Porto

Biblioteca José Mindlin (Universidade de São Paulo)

Biblioteca Nacional do Brasil, Rio de Janeiro

Biblioteca Nacional de Portugal, Lisboa

Biblioteca Nacional da Espanha, Madrid

Biblioteca Nazionale, Nápoles

Biblioteca Nacional da França

Biblioteca Bodleiana, Universidade de Oxford

Bosch Brazilian Library, Estugarda

Biblioteca Britânica

Casa de Bragança

Universidade Harvard

Lello & Irmãos

Real Gabinete Português de Leitura, Rio de Janeiro

Sociedade Martins Sarmento, Guimarães

Universidade de Coimbra

Harry Ransom Humanities Research Center, Universidade do Texas em Austin

The Hispanic Society of America, Nova Iorque

John Carter Brown Library, Universidade Brown, Providence

Biblioteca Pública e Arquivo Regional de Ponta Delgada, Açores

 

 


 

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