quinta-feira, 5 de junho de 2025

EFEMÉRIDES DO FOCUS PORTAL CULTURAL - HÁ 127 ANOS NASCIA FEDERICO GARCÍA LORCA, O POETA DA ALMA ANDALUZA E UNIVERSAL





Neste 05 de junho, o Focus Portal Cultural celebra uma data marcante na história da literatura mundial: o nascimento de Federico García Lorca, ocorrido há exatos 127 anos, em 5 de junho de 1898, na pequena Fuente Vaqueros, província de Granada, Espanha. 

Lorca, um dos mais brilhantes e inovadores poetas e dramaturgos do século XX, legou ao mundo uma obra que transcende fronteiras e gerações. Sua poesia, profundamente enraizada na cultura e paisagem andaluza, é um mergulho na alma humana, explorando temas como o amor, a morte, a identidade, a injustiça social e a repressão. 

Desde cedo, Lorca demonstrou uma sensibilidade ímpar para a arte, estudando música, literatura e teatro. Sua passagem pela Residencia de Estudiantes em Madri o colocou em contato com as mentes mais vanguardistas da época, incluindo Salvador Dalí e Luis Buñuel, influenciando e sendo influenciado por essa efervescente Geração de 27. 

Em seus "Cantos Nuevos", escrito em 1920, Lorca já revelava sua sede por uma nova poesia, desprendida dos clichês românticos e das "luas e lírios" que povoavam os versos de seu tempo. Ele ansiava por um "cantar luminoso e repousado, cheio de pensamento, virginal de tristezas e de angústias e virginal de sonhos" – um manifesto precoce de sua busca por uma arte autêntica e profundamente humana.

A tragédia de sua morte prematura em 1936, no início da Guerra Civil Espanhola, fuzilado por forças franquistas, calou uma das vozes mais potentes de sua época. No entanto, o legado de Federico García Lorca permanece vivo e ressoante, ecoando em cada verso, em cada peça teatral, e inspirando incontáveis artistas e leitores ao redor do globo. 

Que esta efeméride seja um convite à redescoberta da obra imortal de Federico García Lorca, um poeta cuja sensibilidade e visão continuam a iluminar os caminhos da criação e da compreensão humana.

 

 

FEDERICO GARCÍA LORCA: POETA, DRAMATURGO E MÁRTIR DA ALMA ESPANHOLA 

Federico García Lorca é uma das figuras mais célebres e trágicas da literatura espanhola. Membro fundamental da renomada "Geração de 27", sua obra, profundamente enraizada no folclore e na paisagem da Andaluzia, explora temas universais como amor, morte, identidade, desejo e injustiça social com uma intensidade lírica e um poder dramático profundos.

Nascido em 5 de junho de 1898, em Fuente Vaqueros, uma pequena cidade na fértil Vega de Granada, Espanha, Lorca era filho de um proprietário de terras próspero, Federico García Rodríguez, e de Vicenta Lorca Romero, uma professora que incentivou seu amor precoce pela música e literatura. Desde jovem, Lorca demonstrou uma sensibilidade e inclinação artística notáveis. Começou a estudar música aos 11 anos, desenvolvendo talento para o piano, e mais tarde cursou Direito, Literatura e Filosofia na Universidade de Granada. Durante esses anos formativos, ele se imergiu na música folclórica andaluza, na cultura cigana e nas canções tradicionais espanholas, o que influenciaria profundamente sua voz poética única.

Em 1919, Lorca mudou-se para Madri e foi morar na Residencia de Estudiantes, um vibrante centro intelectual que reunia os jovens artistas e pensadores mais promissores de sua geração. Ali, ele forjou amizades e colaborações artísticas duradouras com figuras como Salvador Dalí, Luis Buñuel, Rafael Alberti e Juan Ramón Jiménez. Esse período foi crucial para seu desenvolvimento artístico. Ele experimentou diversas formas e temas, publicando seu primeiro livro de poemas, Libro de poemas, em 1921. Sua crescente fascinação pela cultura cigana levou ao aclamado Romancero Gitano (Romanceiro Cigano), publicado em 1928, que o catapultou à fama nacional. Essa coletânea mesclava magistralmente formas de balada tradicionais com imagens de vanguarda, explorando temas de destino, paixão e a existência trágica do povo cigano.

Um período de crise pessoal e exploração artística levou Lorca a Nova York em 1929, onde estudou na Universidade de Columbia. Suas experiências na movimentada metrópole, marcadas pela Crise de Wall Street e pela sensação onipresente de alienação, impactaram profundamente sua obra. Esse período produziu Poeta en Nueva York (Poeta em Nova York), uma coleção pungente de poemas surrealistas que criticava a sociedade industrial moderna e explorava temas de injustiça racial e angústia espiritual.

Ao retornar à Espanha em 1930, com o advento da Segunda República Espanhola, Lorca dedicou-se cada vez mais ao teatro. Tornou-se diretor de "La Barraca", uma companhia teatral estudantil itinerante financiada pelo governo, que tinha como objetivo levar peças clássicas espanholas ao público rural. Através de "La Barraca", Lorca não só revitalizou o drama espanhol, mas também desenvolveu suas próprias peças poderosas e experimentais. Suas principais obras teatrais, incluindo Bodas de sangre (Bodas de Sangue, 1933), Yerma (1934) e La casa de Bernarda Alba (A Casa de Bernarda Alba, 1936), são obras-primas do drama poético. Essas peças, muitas vezes ambientadas na Andaluzia rural, exploram a opressão feminina, a rigidez dos códigos sociais e as trágicas consequências de desejos reprimidos. 

A eclosão da Guerra Civil Espanhola em julho de 1936 marcou um fim brutal para a vida de Lorca. Apesar dos avisos de amigos, ele retornou a Granada, cidade que rapidamente caiu sob controle Nacionalista. Suas opiniões liberais, sua homossexualidade abertamente vivida e sua associação com o governo Republicano o tornaram um alvo.

Em 19 de agosto de 1936, Federico García Lorca foi preso por forças Nacionalistas e, tragicamente, executado e enterrado em uma vala comum em algum lugar entre Víznar e Alfacar. Seu assassinato tornou-se um símbolo da brutal repressão e da devastação cultural da guerra. 

O legado de Federico García Lorca, embora tragicamente interrompido, permanece imenso. Sua poesia é celebrada por sua beleza lírica, suas imagens evocativas e sua profunda exploração da experiência humana. Suas peças continuam a ser encenadas em todo o mundo, admiradas por sua intensidade dramática, sua profundidade psicológica e seus temas atemporais. A obra de Lorca transcende fronteiras nacionais, oferecendo uma voz poderosa e duradoura para a liberdade, a paixão e o espírito humano perene diante da adversidade. Ele não é apenas um poeta e dramaturgo, mas um ícone da cultura espanhola, cuja arte continua a ressoar com profunda relevância no século XXI.

© Alberto Araújo

 





GARCÍA LORCA: MEIO PÃO E UM LIVRO

Discurso do poeta Federico García Lorca na sua cidadezinha de ‘Fuente Vaqueros’ (Granada, Espanha), em setembro de 1931. 

“Quando alguém vai ao teatro, a um concerto ou mesmo a uma festa de qualquer índole que seja, se a festa é de seu agrado, imediatamente lembra e lamenta que as pessoas que ele ama não se encontrem ali. «Minha irmã e meu pai gostariam de estar aqui», pensa, e não desfruta mais do espetáculo, a não ser através de uma leve melancolia. Esta é a melancolia que eu sinto, não pela gente de minha casa, o que seria pequeno e ruim, mas por todas as criaturas que por falta de meios e por desgraça não desfrutam do supremo bem da beleza que é vida e bondade, serenidade e paixão. 

“Por isso nunca tenho um livro, porque presenteio todos que compro, que são numerosos, e por isso estou aqui honrado e contente em inaugurar esta biblioteca da cidadezinha, a primeira seguramente de toda a província de Granada. 

“Não só de pão vive o homem. Eu se tivesse fome e estivesse à míngua na rua não pediria um pão; pediria meio pão e um livro. E daqui eu ataco violentamente aos que somente falam de reivindicações econômicas sem jamais apontar as reivindicações culturais que é o que os povos pedem aos gritos. Bem está que todos os homens comam, porém que todos os homens saibam. Que desfrutem de todos os frutos do espírito humano porque o contrário seria convertê-los em máquinas a serviço do Estado, seria convertê-los em escravos de uma terrível organização social. 

“Eu tenho muito mais pena de um homem que quer saber e não pode, do que de um faminto. Porque um faminto pode acalmar sua fome facilmente com um pedaço de pão ou com umas frutas, porém um homem que tem ânsia de saber e não possui os meios, sofre uma terrível agonia porque são livros, livros, muitos livros o que necessita e onde estão estes livros?

“Livros! Livros! Aqui está uma palavra mágica que equivale a dizer: «amor, amor», e que deveriam pedir os povos como pedem pão ou como desejam a chuva para suas colheitas.

Quando o insigne escritor russo Fiódor Dostoievski, pai da revolução russa muito mais que Lênin, estava prisioneiro na Sibéria, afastado do mundo, entre quatro paredes e cercado por desoladas planícies de neve infinita; e pedia socorro em carta a sua família distante, somente dizia: «Envia-me livros, livros, muitos livros para que minha alma não morra!». 

Tinha frio e não pedia fogo, tinha uma sede terrível e não pedia água: pedia livros, ou seja, horizontes, escadas para subir a montanha do espírito e do coração. Porque a agonia física, biológica, natural, de um corpo por fome, sede ou frio, dura pouco, muito pouco, mas a agonia da alma insatisfeita dura a vida inteira.

“Já disse o grande Menéndez Pidal, um dos sábios mais verdadeiros da Europa, que o lema da República deve ser: «Cultura». Cultura porque somente através dela se pode resolver os problemas que hoje debate o povo, cheio de fé, porém falto de luz”.

Setembro de 1931.

Tradução Antonio de Freitas – com contribuição de Dr. Gonzalo Velasco, do Uruguai

 

(Clicar na imagem para ver o discurso ou

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