sexta-feira, 7 de novembro de 2025

EFEMÉRIDES | FOCUS PORTAL CULTURAL ALBERT CAMUS: 112 ANOS DO NASCIMENTO DO HOMEM QUE ENFRENTOU O ABSURDO COM LUCIDEZ E HUMANIDADE


No dia 7 de novembro de 1913, na pequena cidade de Mondovi, na então colônia francesa da Argélia, nascia Albert Camus, aquele que o século XX consagraria como um dos maiores nomes da literatura e do pensamento filosófico contemporâneo. O destino o levaria cedo demais, em 04 de janeiro de 1960, aos 46 anos, vítima de um acidente de automóvel em Villeblevin, França, mas sua voz, marcada pela lucidez e pela compaixão, segue viva e necessária, como um farol que ilumina as contradições da existência moderna. 

Camus não foi apenas um escritor. Foi um pensador da condição humana, um poeta da revolta e um cronista do desamparo. Sua vida e sua obra se fundem no mesmo movimento: o da busca de sentido em meio ao absurdo da vida, um conceito que ele imortalizou e que continua a desafiar gerações. 

Filho de uma família pobre, Camus cresceu em um bairro popular de Argel, sob o sol implacável do Mediterrâneo e o peso silencioso da ausência paterna, seu pai, combatente da Primeira Guerra Mundial, morreu na Batalha do Marne quando ele ainda era bebê. Criado pela mãe, uma mulher analfabeta e quase surda, o menino aprendeu desde cedo o valor do silêncio, da dignidade e da resistência. 

Essas origens humildes seriam, mais tarde, a matéria sensível de sua literatura. O contraste entre a luz argelina e as sombras da injustiça social percorre toda sua obra. Em "O Estrangeiro" (1942), Camus faz emergir a figura de Meursault, um homem que vive à margem das convenções, indiferente ao mundo e à moralidade comum, mas profundamente consciente de si e de sua mortalidade. O romance, escrito com uma linguagem seca, direta e límpida, é ao mesmo tempo uma denúncia da alienação moderna e uma parábola sobre a liberdade interior diante do absurdo. 

Traduzido em mais de 40 idiomas, com mais de oito milhões de exemplares vendidos, O Estrangeiro tornou-se um dos livros mais influentes da literatura mundial. Sua força reside na aparente simplicidade, que esconde uma filosofia profunda: o reconhecimento de que a vida, embora sem sentido último, pode ser vivida com intensidade, beleza e ética. 

Camus se opôs a todos os dogmas. Recusou tanto o niilismo desesperado quanto as ideologias totalitárias que prometeram “salvação” ao homem moderno. Para ele, o mundo é absurdo, não porque seja feio ou cruel, mas porque não há correspondência entre nossa sede de sentido e o silêncio do universo. 

Em seu ensaio "O Mito de Sísifo" (1942), Camus desenvolve essa ideia com clareza quase matemática. Sísifo, condenado pelos deuses a rolar eternamente uma pedra montanha acima apenas para vê-la cair de novo, é o símbolo da condição humana. Somos todos Sísifos, conscientes de nossa tarefa inútil, mas ainda assim capazes de dar sentido ao próprio gesto. “É preciso imaginar Sísifo feliz”, escreveu Camus, numa das frases mais poderosas da literatura filosófica. 

Essa consciência do absurdo, longe de paralisar, conduziu Camus a uma ética da revolta, não a revolta destrutiva, mas a que afirma a dignidade da vida mesmo sem garantias metafísicas. Revoltar-se, para ele, era uma forma de dizer “sim” à existência, ainda que o mundo dissesse “não”. 

Durante a Segunda Guerra Mundial, Camus integrou a Resistência Francesa, dirigindo o jornal clandestino Combat. Nesse período, consolidou-se sua visão ética e política: um humanismo que se recusava a compactuar com o totalitarismo, o fanatismo e a violência em nome de qualquer causa. 

Nos ensaios reunidos em O Homem Revoltado (1951), ele critica tanto o niilismo quanto as revoluções que sacrificam o indivíduo em nome de ideias abstratas. Para Camus, o homem digno é aquele que se rebela sem deixar de amar o mundo; que luta sem ódio; que sonha com a justiça sem renunciar à compaixão. 

Seu pensamento era radical na medida exata da sua humanidade: “A verdadeira generosidade para com o futuro está em dar tudo ao presente.” 

Camus foi romancista, dramaturgo, ensaísta, jornalista e até roteirista de cinema. Escreveu peças de teatro como Calígula, O Mal-Entendido e Os Justos, que exploram os dilemas da liberdade, da culpa e do poder. Em todas elas, a tensão entre o absurdo e a necessidade de sentido permanece como eixo. 

Sua linguagem, de uma limpidez quase clássica, faz de cada frase um ato de resistência contra o desespero. Camus escrevia como quem deseja salvar o homem de si mesmo, não com promessas, mas com lucidez e ternura.

Em 1957, aos 44 anos, recebeu o Prêmio Nobel de Literatura, tornando-se um dos mais jovens laureados da história. A Academia Sueca reconheceu nele “a obra que ilumina os problemas da consciência humana em nossa época”. Na cerimônia, Camus falou com humildade: “Cada geração, sem dúvida, se sente destinada a refazer o mundo. A minha sabe, porém, que não o refará. Mas talvez a sua tarefa seja impedir que o mundo se desfaça.” Essas palavras, mais de meio século depois, soam proféticas.

O destino, ironicamente, reservou a Camus uma morte absurda, um acidente de automóvel em uma estrada francesa. Encontraram no banco do carro o manuscrito inacabado de O Primeiro Homem, obra de forte cunho autobiográfico, em que o autor revisita a infância pobre em Argel e o amor pela mãe. Publicado postumamente em 1994, o livro revela o lado mais terno e íntimo de Camus: o homem dividido entre duas pátrias, entre a luz do Mediterrâneo e as sombras da Europa em crise. 

Albert Camus é, ainda hoje, uma das vozes mais necessárias do nosso tempo. Sua filosofia do absurdo e da revolta continua a ecoar numa era marcada pela pressa, pela desinformação e pela perda de sentido. Ele nos lembra que viver é resistir, e que a liberdade só tem valor quando unida à justiça e ao amor. 

Camus acreditava que o homem deve caminhar “sem resignação e sem desespero”, aceitando o absurdo sem ceder ao cinismo. Sua obra é, por isso, um convite à coragem ética e à beleza da lucidez. 

Nascido entre o mar e o deserto, filho da pobreza e da luz, Albert Camus nos ensinou que, mesmo diante do silêncio do universo, a vida pode e deve ser afirmada. Como ele próprio escreveu: “No meio do inverno, aprendi enfim que havia em mim um verão invencível.” 

Hoje, ao celebrarmos os 112 anos do nascimento desse mestre da condição humana, o Focus Portal Cultural presta homenagem a um espírito que continua a inspirar leitores, pensadores e sonhadores em todo o mundo. 

Albert Camus permanece entre nós, não como um ídolo, mas como um companheiro de travessia, lembrando-nos de que a verdadeira grandeza está em viver, com lucidez e ternura, o mistério da existência.

© Alberto Araújo

Focus Portal Cultural














Professor Rivo Giannini disse: 👍Parabéns pela, matéria sobre um dos intestinais mais importantes do século XX. Rivo.

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Verdade! Como encerrei "Albert Camus permanece entre nós, não como um ídolo, mas como um companheiro de travessia, lembrando-nos de que a verdadeira grandeza está em viver, com lucidez e ternura, o mistério da existência. Obrigado. Abraços do Alberto Araújo.






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