quinta-feira, 1 de maio de 2025

O SILÊNCIO DOURADO DAS PÁGINAS - CONTO DE ALBERTO ARAÚJO

 

Elias Ventura era um nome sussurrado com reverência nos corredores das bienais, nas mesas de bar dos encontros literários, nas resenhas apaixonadas nos sites. Seu romance de estreia, "O Tear das Almas", havia tecido uma trama tão intrincada de personagens e emoções que instantaneamente o alçou ao panteão dos best-sellers, traduzido para dezenas de línguas e objeto de estudo em universidades. 

Mas o sucesso não lhe toldara a visão. Elias continuava o mesmo homem de passos lentos e olhar contemplativo, o mesmo vizinho que trocava figos da sua pequena horta pelos pães artesanais da padaria da esquina. Sua casa, no coração do bairro boêmio, permanecia um refúgio de livros amontoados, de anotações rabiscadas em guardanapos e do aroma constante de café fresco. 

A comunidade literária o amava não apenas pelo talento inegável, mas pela sua generosidade discreta. Elias era o primeiro a estender a mão a um autor iniciante, a ler manuscritos com a atenção de um garimpeiro em busca de ouro, a oferecer um conselho ponderado sem jamais soar condescendente. Frequentava os lançamentos de outros escritores com a mesma humildade com que recebia os seus, sempre com um sorriso genuíno e palavras de incentivo. 

Lembro-me de um jovem poeta, trêmulo e inseguro, apresentando seu primeiro livro em um pequeno evento. A plateia rareava e o desânimo pairava no ar. Elias, sentado discretamente na última fila, levantou-se ao final da leitura e, com a voz calma e firme que todos conheciam, teceu elogios tão sinceros e perspicazes que o poeta floresceu ali mesmo, sob o olhar acolhedor do mestre. 

O segredo de Elias talvez residisse em nunca ter se deixado consumir pela voracidade do mercado. Para ele, a escrita era um ato de entrega, uma busca incessante pela beleza e pela verdade nas palavras. O sucesso era uma consequência bem-vinda, mas não o motor da sua arte.

Anos se passaram desde "O Tear das Almas", e Elias presenteou seus leitores com mais três romances aclamados, cada um deles uma nova incursão nas profundezas da alma humana. Mas sua maior obra, talvez, fosse a maneira como ele transitava pelo mundo literário: com a leveza de quem conhece o valor de cada palavra e o respeito por cada contador de histórias, fosse ele um nome consagrado ou um sonhador rabiscando seus primeiros versos em um caderno surrado. Elias Ventura, o best-seller amado, nos ensinou que o verdadeiro ouro da literatura reside não no brilho efêmero do sucesso, mas no silêncio dourado das páginas que tocam o coração.

© Alberto Araújo

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário