domingo, 25 de maio de 2025

QUAL A SANDÁLIA QUE VOCÊ PRECISA PARA ESTAR NA PRESENÇA DE DEUS? REFLEXÃO DE ALBERTO ARAÚJO

 


 

O sol de outono em Niterói já amaciava a manhã, pintando de ouro as folhas que teimavam em resistir nas árvores da rua. Eu caminhava despreocupadamente, pensando em coisas banais, algo que tinha de resolver no cotidiano,  quando meus olhos pousaram numa vitrine peculiar. Não eram roupas da moda, nem eletrônicos de última geração. A loja exibia sandálias. Simples sandálias de couro, de borracha, com tiras coloridas e outras discretas. Mas o que chamou minha atenção era a placa singela acima da porta: "Calçados para a Jornada da Alma"

Que reflexão! Pensei em quantas vezes meus pés já haviam desfilado por calçadas, praias e salões, calçados com os mais diversos modelos, tênis para a corrida matinal, calçados para ocasiões especiais. Mas sandálias para a "jornada da alma"? Que sandálias seriam essas? 

Entrei na loja, curioso como uma criança diante de um brinquedo novo. O atendente, um senhor de barba branca e olhar calmo, me recebeu com um sorriso sereno. Perguntei sobre a proposta da loja, esperando alguma explicação metafórica elaborada.

Ele apontou para uma sandália de couro simples, sem adornos. "Esta aqui," disse com voz tranquila, "é a sandália da humildade. Para estar na presença de Deus, é preciso descalçar o orgulho, a vaidade, a prepotência. Sentir a simplicidade da terra sob os pés."

Em seguida, mostrou uma sandália de borracha resistente. "Esta é a sandália da perseverança. A jornada da alma é longa e cheia de obstáculos. É preciso ter firmeza para seguir em frente, mesmo quando os caminhos se tornam pedregosos." 

Meus olhos percorreram os outros modelos. Havia uma sandália com tiras que se entrelaçavam. "Esta é a sandália da conexão," explicou o senhor. "Precisamos estar ligados uns aos outros, praticar a empatia, a compaixão. A presença de Deus se manifesta no amor ao próximo."

Vi também uma sandália leve, quase transparente. "Esta é a sandália do desapego. Deixar para trás o que pesa, o que aprisiona. Livrar-se das amarras materiais para voar mais alto, em direção ao espiritual."

Por fim, ele pegou uma sandália adornada com pequenas pedras brilhantes. "E esta," disse com um brilho nos olhos, "é a sandália da gratidão. Celebrar as pequenas bênçãos, reconhecer a beleza do caminho, agradecer por cada passo dado." 

Saí da loja com as mãos vazias, mas com o coração cheio. Não comprei nenhuma sandália daquelas, mas a conversa com o senhor me fez refletir sobre as verdadeiras necessidades da jornada interior. Percebi que as sandálias que realmente precisamos para "estar na presença de Deus" não são feitas de couro ou borracha, mas de sentimentos e atitudes.

A humildade para reconhecer nossa pequenez diante da grandeza divina. A perseverança para não desistir diante dos desafios da fé. A conexão com o outro, através do amor e da solidariedade. O desapego das coisas materiais que nos distraem do essencial. E a gratidão constante por tudo que nos é dado.

Enquanto caminhava de volta para casa, meus pés calçados em minhas sandálias habituais, senti que a verdadeira jornada da alma não depende do que calçamos, mas de como trilhamos o caminho. E talvez, a cada passo, possamos ir descalçando o que nos impede de sentir a presença divina em cada detalhe da vida, aqui mesmo, nas ruas ensolaradas de Niterói.

© Alberto Araújo 




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