Nas últimas postagens em sua página no Facebook, o professor Marco Antônio tem presenteado seus leitores com reflexões densas e sensíveis sobre a obra de Nélida Piñon, nossa grande dama da literatura brasileira.
Com a capa do livro A Casa da Paixão, exemplar que guarda com carinho, autografado pela própria autora, o professor destacou a força dessa narrativa inaugural. Em diálogo, Alberto Araújo recordou também possuir um exemplar autografado não de A Casa da Paixão, mas de “O Presumível Coração da América”, testemunhando a mesma honra de ter recebido das mãos de Nélida esse gesto de proximidade literária.
Nas suas notas críticas, Marco Antônio afirma que a narrativa de Nélida é “uma máquina complexa, carregada de sonhos mais ou menos despertos, de apostas sobrenaturais, explosões de afetos, sentimentos recalcados, isto é, traumas emocionais, esperanças partidas”, onde confluem discursos políticos, morais, religiosos e históricos. Em sua visão, a escritora ensina a “respeitar o fluxo narrativo” e recusa os atalhos fáceis da intriga ou do escândalo.
Outra de suas observações parte de A República dos Sonhos, em que Nélida adverte: “Desconfie das palavras. Elas tanto afirmam, quanto desdizem”. Para Marco Antônio, a autora compreendia os perigos do trabalho com a linguagem e nunca se deixava aprisionar pela tentação de escrever apenas sobre o próprio ato de escrever.
A dimensão religiosa, presente desde Guia-Mapa de Gabriel Arcanjo e Madeira Feita Cruz, é lembrada pelo professor como um traço que perpassa toda a obra de Nélida, numa tensão constante entre sagrado e profano — uma travessia onde ambos se encontram em busca de novas passagens.
E, por fim, Marco Antônio ressalta o fio da consciência que costura sua ficção. Seja em Tempo das Frutas, seja na monumental República dos Sonhos, a consciência aparece como “arma implacável que tritura ou redime a façanha cotidiana”, muitas vezes assumindo a forma de aforismos que adensam a linguagem sem quebrar o ritmo narrativo.
Dessas postagens emerge um retrato vigoroso da escritora: Nélida Piñon, que conhecia, como bem disse o professor: “os limites ilimitados do real”. Para ela, a realidade nunca precisou ser rotulada de fantástica, surreal ou maravilhosa: ela simplesmente é, e nesse ser carrega em si mesma os inesperados contornos que alimentam a grande literatura.
© Alberto Araújo
SOBRE O PROFESSOR MARCO ANTÔNIO MARTINS PEREIRA
Professor, escritor, crítico literário e pesquisador, Marco Antônio Martins Pereira construiu ao longo de sua trajetória uma carreira marcada pelo amor às letras, à docência e à cultura.
Formado em Letras pela Faculdade Sousa Marques e pós-graduado em Latim pela Université de Nancy (França), dedicou-se ao ensino do Português, Latim, Grego e Francês, com especial destaque para o Português Jurídico, o Latim Forense, as Técnicas Processuais e o Direito Canônico.
Foi professor das tradicionais instituições Universidade Cândido Mendes (UCAM) e Universidade Gama Filho, além das Faculdades Integradas Simonsen, onde se destacou como mestre de gerações de alunos.
Como pesquisador e ensaísta, é biógrafo de nomes fundamentais da literatura brasileira, entre eles Euclides da Cunha, Augusto dos Anjos, Clarice Lispector e Lima Barreto. Autor de obras de referência, como Latim Forense, atua também como conferencista, tendo proferido palestras em diversas academias e instituições, entre elas a Federação das Academias de Letras do Brasil, sobre temas como Augusto dos Anjos e A Importância do Latim Jurídico.
Reconhecido nacional e internacionalmente, é Membro da Société des Études Latines e do Conseil International de la Langue Française, entidades de prestígio que reúnem grandes estudiosos da língua e da cultura.
Foi convidado pelo então Ministro da Cultura, Francisco Weffort, para a cerimônia oficial de entrega do Prêmio Ministério da Cultura, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro (1998).
Recebeu a Cruz do Mérito Cultural e distinções como o título de Professor Laureado e o Destaque Especial no IV Concurso Nacional de Crônicas (1995), reforçando sua contribuição à literatura e à crítica.
Além de suas contribuições acadêmicas, Marco Antônio também se destaca como crítico cultural, realizando análises de obras literárias, de autores e de produções artísticas contemporâneas. Entre elas, suas reflexões sobre a minissérie Presença de Anita (TV Globo, 2001), onde abordou com rigor e sensibilidade os aspectos narrativos e simbólicos da trama. No campo clássico, dedica-se igualmente às críticas e estudos sobre o Latim, defendendo a importância dessa língua como fundamento da cultura, da literatura e do pensamento jurídico.
Entre suas paixões recentes, estão publicações de leitura crítica da obra de Nélida Piñon, autora sobre a qual escreve com a sensibilidade e a profundidade de quem enxerga na literatura não apenas um reflexo da realidade, mas um percurso de vida e consciência.
Morador do Rio de Janeiro, Marco Antônio Martins Pereira é, sobretudo, um intelectual que fez da sala de aula, da palavra e da memória literária um espaço de permanência e de luz.
Biografia elaborada por Alberto Araújo,
especialmente para esta postagem.
© Alberto Araújo
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